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Novas normas de qualidade: será que agora vai ?

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

EM 21/04/2002

5 MIN DE LEITURA

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Após dois anos de expectativa e frustração, parece que as coisas estão novamente caminhando no que se refere às novas normas de produção de leite no Brasil. O Ministério da Agricultura anunciou audiência pública para o dia 30 deste mês, visando aparar as arestas da legislação proposta, em especial naquilo que desagrada os pequenos produtores, que vêem o risco de alijamento do setor caso os prazos e quesitos contidos na Portaria 56 sejam mantidos.

Ainda que tardia, tal retomada deve ser motivo de comemoração pelo setor. Diria até que a não aprovação imediata, logo após o término da consulta pública, como desejavam seus proponentes, teve lá suas vantagens. Permitiu que o setor sentasse à mesa de forma mais ampla e aberta e discutisse seus problemas. O que vier a ser aprovado terá sido referendado por um número maior de pessoas e entidades e, portanto, terá maior representatividade e menor resistência uma vez implantado.

Relacionado a este tema, também foi notícia o anúncio de que o Ministério da Agricultura instituiu o Redeleite - Rede Brasileira dos Laboratórios de Controle da Qualidade do Leite, responsável pelo monitoramento da qualidade do leite, e irá liberar R$ 12,5 milhões para seu funcionamento.

Esta notícia, aliada à retomada das discussões sobre a Portaria 56, permite ao setor considerar a hipótese de que a aprovação está, enfim, mais próximo do que se imaginava. Do ponto de vista político, resolvendo-se (ou amenizando-se) os problemas com os pequenos produtores, notadamente da região Sul, terra do Ministro Pratini, a aprovação das novas normas pode ser utilizada politicamente como conquista do Ministro, cuja imagem tem sido cada vez mais associada ao dinamismo e aos resultados obtidos pelo agronegócio brasileiro, facilitada, claro, pelos bons resultados do agronegócio, especialmente se comparados com outros setores da economia. De repente, aparando-se as arestas da Portaria 56, Pratini pode vir a ter um bom trunfo nas mãos, o de "iniciar" a modernização de um gigante adormecido, que gera mais de R$ 6,6 bilhões por ano e emprega algo em torno de 5 milhões de pessoas - e possíveis eleitores.

Mais do que isso, é provável que a incompatibilidade dos atuais padrões de qualidade do leite com a necessidade de traduzir em resultado econômico o bordão "Exportar ou Morrer" tenha pesado para que o governo federal se movesse nessa questão. Para o país, manter saldo comercial favorável é mais do que algo desejável: é fundamental. Veja o texto abaixo, extraído da revista Exame (17/04/02):

"Com uma dívida de 220 bilhões de dólares, o país precisa manter um fluxo anual de 22 bilhões só para o serviço dessa dívida. Obter dólares no exterior para manter em dia o saldo do balanço de pagamentos é crucial, portanto. Desde meados dos anos 90, parte da conta tem sido garantida por uma entrada generosa de investimentos diretos estrangeiros, que cresceram de uma média insignificante de 1 bilhão de dólares, em 1990, para um total de 33 bilhões, no auge, em 2000 (...) Se o ingresso de capital retroceder (como já ocorreu em 2001, quando entraram 23 bilhões de dólares), o país precisará contar com outras fontes de financiamento. "Se durante dois anos seguidos não tivermos como gerar saldo, correremos o risco de uma argentinização: os credores retirarão o crédito, FMI e Banco Mundial exigirão medidas drásticas e desceremos ladeira abaixo", diz César Souza, diretor do escritório brasileiro da Monitor, empresa de consultoria fundada pelo guru americano Michael Porter, professor da Universidade Harvard. Não é à toa que o presidente Fernando Henrique Cardoso lançou o brado "é exportar ou morrer".

Como "argentinização" é algo que ninguém deseja nem para o pior inimigo, deve-se tratar de obter os dólares necessários, sendo a exportação um dos caminhos. Nesse quesito, o agronegócio é pródigo de exemplos bem sucedidos, como a soja, o frango, o suco de laranja e, mais recentemente, o algodão e até o boi, que vem obtendo números expressivos e ensaiando uma maior profissionalização da cadeia. O leite, infelizmente, não tem tido espaço nesta lista de exemplos, pelo contrário: chegou a representar 10% do rombo da balança comercial brasileira, número este que foi bastante reduzido nos últimos dois anos.

É importante, no entanto, saber separar a melhoria da qualidade do leite como um aspecto que ajuda a posicionar melhor o país para atuar no mercado exterior, da obrigatoriedade de se implantar as novas normas para que se possa exportar. São duas coisas absolutamente distintas e que têm sido constantemente misturadas em discursos muitas vezes inflamados e que podem carregar o objetivo lícito de acelerar o processo de aprovação das normas. É evidente que, com novas normas e com uma orientação cada vez maior a um mercado mais exigente, com hábitos de consumo distintos e com outra complexidade de mercado, o setor é estimulado a evoluir e a ganhar eficiência, qualidade e maturidade. Foi o que aconteceu com a indústria avícola, por exemplo. Sendo assim, a implantação das novas normas pode auxiliar a criar uma atmosfera mais propícia ao desenvolvimento e à qualificação do setor como um todo, ainda mais se houver o estímulo para a exportação, seja pela competividade do setor em comparação a outros países, seja pelo potencial de produção, seja pela necessidade do governo em obter dólares.

No entanto, não se pode achar que com a implantação das novas normas, independentemente das mudanças que virão a sofrer no dia 30 deste mês, teremos acesso aos mais diversos mercados, isto é, iremos, finalmente EXPORTAR com letras maíusculas... Primeiro, as normas não são exigência de nenhum país importador ou órgão regulador. É diferente, por exemplo, das exigências de rastreabilidade da carne bovina por parte da Comunidade Européia, segundo as quais a partir de junho não importará mais carne de animais que não possam ser rastreados até sua origem. Segundo, as novas normas de lácteos estão ainda muito defasadas das vigentes em países como os EUA, Canadá, Nova Zelândia e a própria Comunidade Européia. Terceiro, há bem mais do que normas de qualidade envolvidas nas relações comerciais internacionais envolvendo lácteos, um dos setores mais protegidos do agronegócio, com alta carga de subsídios. Quarto, é possível exportar matéria prima de alta qualidade mesmo estando em um país com qualidade média inferior. A Índia, por exemplo, exporta lácteos para os EUA, e a qualidade média da matéria-prima nesse país está longe de atingir os padrões americanos. O Brasil já vem exportando, ainda que timidamente. Determinada indústria pode perfeitamente estabelecer um padrão de qualidade "tipo exportação", como vem ocorrendo com o café, cuja qualidade média deixa a desejar, embora lotes de elevada qualidade sejam exportados para fornecedores exigentes como a Starbucks ou a Illy.

Portanto, não há, necessariamente, relação direta entre as novas normas e a exportação, ainda que para determinados mercados possamos desfrutar de vantagens por conta das normas. De qualquer forma, é inegável o efeito indireto de estimular o setor a evoluir e, com isso, criar massa crítica e capacitação necessárias para atuarmos de forma não marginal no concorrido mercado externo de lácteos.
 

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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