As CPIs do leite estão finalizando seus trabalhos, após cerca de 6 meses de audiências, investigações, denúncias e, acima de tudo, muito barulho. Os relatórios estão sendo entregues e agora o momento é de aguardar o que será de fato feito com a montanha de informações que se gerou.
Acompanhando as expectativas do setor em relação ao trabalho que se desenrolou, especialmente conversando com produtores, sentimos que, após um período inicial de grande esperança de resolução dos problemas pela instalação das CPIs, passamos a notar uma certa descrença, muitos temendo um cheiro de pizza no ar. Esses dois momentos distintos são compreensíveis. De início, há aquela expectativa natural de se chegar a uma solução definitiva, ainda mais quando se está em meio à crise e o setor passa a ser discutido em um fóro mais amplo como as CPIs, com grande cobertura da mídia. Em um segundo momento, com o passar do tempo, com adiamentos de relatórios finais (o que eventualmente pode ser necessário para um melhor conhecimento da situação) e com o esfriamento dos ânimos, a esperança às vezes exagerada de solução de todos os problemas pode dar lugar à desesperança também desmedida.
O fato é que, como já comentamos anteriormente, o trabalho realizado pelas CPIs não têm o objetivo direto de trazer as soluções para resolver os problemas do setor, mas sim levantá-los de uma maneira coordenada, permitindo que se discuta soluções a partir de dados e fatos concretos, o que já é uma grande coisa, diga-se de passagem, caso de fato se alcance esse objetivo, visto que o setor não prima pela clareza no fluxo das informações que por ele transitam. Sob essa ótica, havendo sucesso no trabalho, trata-se de um ponto de partida importante e necessário, mas ...
Mas o verdadeiro trabalho ocorrerá a partir de agora. Pois bem, destrinchados e documentados os pontos que distorcem o mercado de leite no Brasil, o que pode ser feito para diminuir essa distorção ? Como contrapor, por exemplo, a concentração no mercado industrial ou a supremacia cada vez mais pronunciada do varejo, impondo condições de negociação cada vez esdrúxulas aos seus fornecedores (essa situação, evidentemente, não é prerrogativa do setor lácteo, mas de quase todos os setores que dependem cada vez mais deste canal de vendas) ?
Uma idéia que merece ser discutida é a criação de uma agência reguladora do setor, a exemplo dos setores de energia elétrica, telecomunicações e petróleo, com o objetivo de evitar as distorções que se fazem muito facilmente em um mercado aberto e que prima pela concentração do poder e do capital. Essa idéia tem sido levantada pelo presidente da Leite Brasil, Jorge Rubez, e merece uma discussão mais profunda de todos os interessados. Nesse aspecto, com o término dos trabalhos das CPIs, uma agência desta natureza teria, em tese, uma quantidade significativa de informações para começar a trabalhar, embora certamente muito mais precise ser feito, não só no campo investigativo, mas também no campo acadêmico, dando subsídio técnico para as decisões.
Nosso "termômetro" sugere que o setor está muito focado nas punições para os infratores, sejam eles indústrias cartelizadas, supermercados ou fornecedores de insumos. Porém, mais do que punições pontuais, o setor lácteo precisa de uma agenda positiva, que permita que a convivência se dê de maneira mais harmônica do que vem ocorrendo. Se é ingenuidade achar que isso possa se dar a partir exclusivamente da iniciativa privada e se é retrocesso defender a regulamentação total do setor (tabelamento, preços mínimos, etc), é provável que idéias como a da criação de uma agência reguladora façam sentido e, assim, acabem ganhando força, podendo, enfim, representar uma luz no fim do túnel.