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Cabe pensar em controle da oferta ?

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

EM 12/04/2002

5 MIN DE LEITURA

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A mídia trouxe nesta semana a notícia de uma Organização não Governamental dos EUA cuja principal missão é reduzir a produção de soja no mundo, visando elevar os preços do produto no mercado mundial. Ela quer ser a OPEP da soja. O que ela faz para conseguir isso ? Pagando US$ 165 por hectare NÃO produzido, ou seja, o agricultor deixa de plantar soja e ganha US$ 165 por cada hectare. Quem tiver por exemplo 1000 ha e topar a proposta da ONG, ganhará US$ 165.000 anuais, limpinhos, ou quase R$ 400.000 anuais. Nada mal !

A ONG funciona no exterior, em países como Canadá e EUA, mas é para a América do Sul, especialmente Brasil e Argentina, que está destinando seus esforços. As razões são claras: primeiro, a produção de soja nestes países é considerável e afeta o mercado mundial; segundo, e mais importante, a competitividade da soja aqui produzida é altíssima, mesmo sem subsídios. O atrativo de um programa destes é altíssimo para o produtor médio nacional.

Frente a esta oferta enviesada de subsídios, as autoridades brasileiras, incluindo o Ministro Pratini, se mostraram irritadas e indignadas. Também, se a moda pega, não precisaremos mais de Ministros, Secretários da Agricultura, etc., afinal nada se produziria por aqui !

Independentemente da pertinência desta proposta, o fato é que há gente preocupada em reduzir ou controlar a oferta de soja no mercado externo.

No caso do leite, vários países adotam um regime de controle de oferta (supply management), com destaque, evidentemente, para o sistema de cotas da Comunidade Européia e, em menor grau, do Canadá. Os Estados Unidos não adotam, mas nota-se cada vez mais nos meios especializados americanos uma flexibilização na discussão em torno de um eventual sistema de cotas. Os baixos preços verificados no último ano, em decorrência do excesso de oferta, e a constatação de que o produtor canadense recebe mais do que o produtor americano são argumentos que têm suscitado a discussão sobre cotas de produção. Também, a necessidade de redução de gastos do governo com subsídios aos produtores tem motivado mais discussões sobre o controle de oferta, uma vez que, neste caso, o ônus cai sobre o consumidor, que passa a ter produtos mais caros à sua disposição, e não sobre o governo diretamente (no final, o contribuinte banca de qualquer jeito).

Os baixos preços tendem geralmente a ocorrer quando a produção supera a oferta, sendo o sistema de restrição da oferta talvez a única maneira de evitar continuamente esta situação. O estímulo ao aumento do consumo de lácteos, por exemplo, pode resolver a situação em determinado momento, mas, mantendo-se elevada a atratividade em função de bons preços, a tendência é que, novamente, a oferta fique descompassada em relação à demanda. O aumento da renda da população resultaria no mesmo, ou seja, aumentaria a base de consumo e, com isso, a oferta de leite ficaria atrás da demanda, inflando preços e estimulando o aumento da produção de leite, porém atingindo novo equilíbrio de mercado. Isso sem falar nas importações e, em menor grau, nas exportações, como mecanismos atuantes neste processo de busca do equilíbrio de mercado.

E no Brasil, há espaço para cotas de produção ? A idéia parece atrativa, especialmente em épocas de preços baixos. Seria muito bom poder controlar o quanto de um produto é colocado no mercado e, com isso, atuar no preço obtido. A OPEP que o diga.

O potencial de produção de leite no País é um argumento que torna a implantação de cotas algo atraente. Como bem lembrou nosso entrevistado da semana passada, o produtor e médico veterinário André Zanaga Zeitlin (leia aqui a entrevista), temos um potencial de produção de leite enormemente represado, muito, mas muito maior do que a demanda represada. Por outro lado, temos um produtor de leite com custo de oportunidade muito baixo e que, a qualquer sinalização positiva do mercado, aumenta barbaramente sua produção. Basta ver o que ocorreu em Goiás, no ano passado. O estímulo de bons preços foi tão significativo, que o setor respondeu com maior produção. Ainda neste cenário, por mais que atuemos nas exportações, é preciso lembrar que leite é produzido nos quatro cantos do mundo e que a quantidade de produto comercializado no mercado exterior ronda 5% do total, ou seja, muito pouco, o que quer dizer que o mercado externo pode ajudar, mas não é a oitava maravilha do mundo. O resultado desse cenário é que os preços internos nunca poderão ser muito altos por muito tempo, porque, neste caso, a disposição para se produzir mais atuaria de forma muito intensa na elevação da oferta, reduzindo novamente os preços.

Além disso, há a questão das imperfeições do mercado, com forças desiguais entre os elos. Quando sobra produto, ou quando parece sobrar, os elos com maior poder de negociação fazem a festa. Quando falta produto, a cadeia produtiva respira.

Por tudo isso, a discussão em torno de restrição da oferta pode ser atrativa.

Porém, a implantação de cotas de produção ou outra forma de restrição da oferta é, hoje, inviável no Brasil. Primeiro, o País ainda não é auto-suficiente, ou melhor, continuamente auto-suficiente; sob esta ótica, não há lógica ou respaldo para se restringir a quantidade produzida. Segundo, enquanto como mecanismo de obter melhor poder de negociação junto à indústria a adoção de cotas ou outras formas de restrição da oferta podem vir a ser interessantes, o caldo entorna caso o preço ao consumidor também aumente. Afinal, a renda da população é em geral baixa e não há espaço para preços elevados. Quem viu o Jornal Nacional nesta quinta-feira sabe do que estou falando: bastou o mercado de leite melhorar que já veio matéria dizendo que o preço aumentou até 35% no varejo (engraçado, quando caiu, ninguém falou nada), consumidores assustados, etc. Segundo o jornal, a associação de produtores disse que não há risco de desabastecimento e, com isso, de escalada ainda maior de preços ... Ou seja, é ilusão achar que se pode vender leite a preços muito mais altos, a não ser em nichos de mercado. Há ainda a questão da desigualdade do setor e do tipo de leite produzido. E, claro, qualquer sistema de restrição de oferta necessitaria de um lobby fortíssimo dos produtores, o que está longe de corresponder à realidade atual.

Enfim, é preciso fazermos muitas lições de casa antes de se pensar em restrição da oferta, mas, caso o setor avance e passe de ano, não será loucura se, em alguns anos, este tema vier a ser debatido com mais seriedade.

Seja isso verdade ou não, é interessante levantar pontos como esse, que podem estimular, como colocou Zeitlin, a proposição de outras soluções que venham a contribuir para que os produtores tenham preços mais estáveis e mais elevados do que hoje.

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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