A expectativa cresce ao tomarmos conhecimento do convênio para a execução do Programa Nacional para o Controle e a Melhoria da Qualidade do Leite e de Produtos Lácteos, assinado entre a Secretaria de Defesa Agropecuária do Mapa, através do DIPOA, e diversas entidades do setor, a saber:
De acordo com a matéria divulgada pelo Mapa, será possível fiscalizar se o produto está chegando ao consumidor conforme os parâmetros estabelecidos na instrução normativa 51 e também verificar possíveis fraudes, como a adição de soro ao leite.
O combate à fraude é ação de extrema importância para que os esforços mobilizados pelo setor privado e público, no que se refere à melhoria da qualidade, sejam bem sucedidos. Segundo notícia desta semana na Folha de S. Paulo, em pesquisa realizada pelo Prof. Sebastião Brandão, da Universidade Federal de Viçosa, foram encontradas alterações em 21 amostras de leite em pó, das 38 analisadas, sendo que, em uma delas, a adição de soro chegou a 60%. Vale dizer que o soro não é a única forma de fraude, embora tenha sido a mais comentada (talvez a mais importante hoje). Existem até falsificações de embalagens de empresas idôneas, para se ter uma idéia até onde chega o problema.
Talvez seja prematuro fazer afirmações generalizadas a partir de alguns resultados, mas, como diz o ditado, "onde há fumaça, há fogo" e justifica-se plenamente a iniciativa do Mapa e das associações conveniadas. Além de lesar o consumidor, que adquire um produto com características nutricionais inferiores, trata-se de concorrência desleal, o que coloca empresas sérias em desvantagem competitiva. Indo mais além na análise, a co-existência entre as fraudes e as tentativas de modernização do setor e de melhoria da qualidade do leite apresenta-se, no mínimo, conflituosa, para não dizer inviável: como justificar o pagamento pela qualidade por parte de uma empresa, se ela tem de disputar as gôndolas com concorrentes que vão em direção contrária, lançando mão de fraudes para competir ?
O trabalho de fiscalização a que se propõe está longe de ser fácil e requer comprometimento e recursos, mas acreditamos que o primeiro passo está sendo dado. É necessário fiscalizar, punir e divulgar publicamente os infratores, caso contrário incorremos no risco ainda maior da imagem do produto ser prejudicada junto à população por culpa das empresas desonestas, resultando em queda no consumo, redução de preços e prejuízo para todos. Também, a divulgação pública coloca um peso ainda maior nas empresas e empresários cuja idoneidade moral e ética não é suficiente para respeitar a legislação vigente.
A julgar pelas notícias sobre o tema, o soro de leite é o principal componente envolvido nas fraudes, fato que talvez seja responsável por criar uma visão distorcida sobre o alimento.
Diversos países do mundo e empresas de grande reputação e qualidade utilizam o soro e seus componentes em diversas aplicações. Não se trata, portanto, de um produto prejudicial à saúde do consumidor, que deva ser eliminado da cadeia alimentar. Pelo contrário, é um produto com características interessantes, que podem e devem ser exploradas economicamente da melhor forma possível, com benefícios para o setor. Se isso não for feito, os custos de tratamento de resíduos ambientais serão um peso adicional, assim como a perda de receitas e, ao final das contas, o custo cairá sobre a cadeia (e aí já se sabe quem paga a maior parte da conta).
O soro, enfim, não é o vilão; vilão é quem o utiliza de forma enganosa, visando ludibriar o consumidor e obter vantagens desleais junto à concorrência. É necessário que o setor procure aplicações nobres e rentáveis para o soro e que se defina em que condições a utilização do alimento junto a outros lácteos poderá ser realizada, sem prejuízo para o setor e para o consumidor.
Deve-se impedir que, legalmente, por sutilezas nas embalagens e nas nomenclaturas empregadas, o consumidor compre um produto de menor valor nutricional do que imagina ou que o leite puro seja prejudicado em relação à sua imagem. A adição de produtos que reduzam o valor nutricional e "desagreguem valor" ao leite, deve ser muito bem pensada e só será defensável caso se possa manter a identidade do leite puro, que deve ser sempre promovido como sendo um produto nobre e superior em qualidade nutricional.