A crise turbinada pelo caso Parmalat nos faz pensar na fragilidade do setor e, ao mesmo tempo, na oportunidade que as cooperativas têm para alcançar um novo estágio na estrutura da cadeia produtiva do leite no Brasil. O modelo atual está em discussão - o BNDES, lideranças do setor e o alto escalão do governo manifestaram a necessidade de repensar a cadeia de produção de leite no país.
Repensar a cadeia produtiva e as estruturas comerciais passa pela comparação com o que ocorre nos demais países onde a produção de leite é significativa. E essa comparação, de imediato, mostra que o Brasil é o único dos grandes países produtores de leite onde as cooperativas não têm um papel majoritário na captação e comercialização, ainda que esse papel no Brasil seja extremamente importante, com 40% do leite passando pelas cooperativas.
Mas não é só isso que diferencia a força do setor cooperativista no Brasil e nos demais países. Nestes, as cooperativas estão mais bem posicionadas e, em grande parte, preparadas para a competição que aumenta a cada dia no setor.
Diversas delas têm joint-ventures, inclusive com empresas não cooperativadas; procuram ter musculatura para atuar no setor de commodities ou ter alta tecnologia para atuar em nichos de mercado com produtos de alto valor agregado; outras atingiram tal porte que começam a ser alvo de medidas contra monopólio, como noticiamos em relação à Arla Foods, que controla o mercado dinamarquês; a própria Arla Foods representa uma situação interessante, onde houve fusão de duas cooperativas de países distintos, algo que tende a ocorrer cada vez mais em se tratando de Europa; a Fonterra, gigante da Nova Zelândia, além da joint-venture com a Nestlé nas Américas, tem negócios com a DFA nos EUA, com a Arla na Europa, com a Britania na Índia e está negociando a participação em uma estatal chinesa, a Sanlu, entre outras iniciativas.
No Brasil, fusões ainda são, em grande parte, um tabu. Apesar de captar parte importante do leite, muitas cooperativas estão distantes do mercado consumidor, vendendo o leite para empresas que detém a marca e a proximidade com o cliente final. Ou, em outra situação, têm um portfólio de produtos com baixa rentabilidade, com baixo valor agregado e não estão posicionadas de forma consistente para atuar no mercado externo.
Claro que há exceções e que a consciência a respeito da fragilidade desse posicionamento vem crescendo no setor. Em julho último, o CBCL e a OCB organizaram um evento para discutir como aproximar e capacitar as cooperativas de leite. Desse evento, com a participação da Embrapa Gado de Leite, detectaram a necessidade de criar uma rede de informações de mercado para o setor, uma rede de negócios, envolvendo compra de insumos e comercialização de leite e formação de gestores. O evento teve a participação do Prof. Fábio Chaddad, da University of Washington, especialista na gestão de cooperativas de leite e que voltou ao país em dezembro último, para organizar um workshop com as principais cooperativas e palestrar no Congresso Internacional do Leite da Embrapa. Isso mostra que há sensibilidade para o problema.
Do ponto de vista de mercado, algumas grandes cooperativas vêm se posicionando. A Itambé, além de procurar centralizar a produção de produtos de maior valor agregado, sinalizou o interesse de alavancar as exportações de lácteos. A CCL vem, sem muito alarde, se reestruturando e já começa a atrair novas cooperativas associadas. A Central Leite Nilza vem ampliando as parcerias e hoje já é uma das principais captadoras de leite do país. Outras cooperativas também procuram se posicionar e ganhar competitividade. Mais importante, através da OCB e CBCL, passam a dialogar umas com as outras, o primeiro passo para um maior entendimento.
Sem dúvida, muito precisa ser feito para que o setor cooperativista tenha a força que tem em outros países. O momento, por pior que seja em relação ao mercado, é muito propício para que as cooperativas dêem o salto necessário, se inserindo de forma mais rentável e mais consistente no mercado de leite. A hora é agora.