O que diz a IN-62 ?
A IN-62 foi publicada em Dezembro de 2011, em substituição a IN-51. A alteração principal foi em relação aos limites para CCS e CBT que tiveram seus valores e prazos alterados, como mostram as Figuras 1 e 2.
Figura 1. Novos limites para média geométrica de CBT nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste.
Figura 2. Novos limites para média geométrica de CCS nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste.
Como estamos em relação aos novos limites ?
A IN-62 prevê, que a partir de Julho de 2016, o leite produzido já esteja atendendo os limites internacionais, com CBT abaixo de 100 mil UFC/mL e CCS abaixo de 400 mil Céls/mL. Desta forma, imagina-se que, por exemplo, o leite brasileiro tenha qualidade que atenda os padrões internacionais e eventualmente maior competitividade no mercado internacional.
Esta melhoria da qualidade ocorreria em fases, num prazo de 3,5 anos. O limite de 600 mil para CCS e para CBT que se iniciou em Janeiro de 2012, termina agora, em Junho de 2014. Já a partir de 01 de Julho de 2014, os limites máximos são reduzidos para 300 mil UFC/mL para CBT e 500 mil cels/mL para CCS, e ficarão válidos por mais 2 anos, até chegar a última etapa com limites mais rígidos em 01 de Julho de 2016.
Para responder a esta pergunta, analisamos o banco de dados da Clínica do Leite-ESALQ/USP, que conta hoje com mais de 360 indústrias parceiras distribuídas nos estados de SP, MG, GO, PR, MS, RJ e BA. Ao todo são cerca de 42.000 produtores que tiveram seu leite analisado durante o ano de 2013.
Vale ressaltar que a IN-62 estabelece os limites em função da média geométrica de todos os resultados do produtor no período de 3 meses. Não podemos simplesmente analisar um resultado individual para dizer se o produtor atende ou não a IN-62. Esta é uma análise equivocada, mas que muitos ainda acabam fazendo, por desconhecimento.
Para esta análise, vamos então calcular a média geométrica de CCS e CBT de cada produtor, olhando todo o ano de 2013. Com isso, faremos uma avaliação de atendimentos aos limites da IN-62 no período de 1 ano.
Na gráfico 01, é apresentada a distribuição dos produtores em função da sua média geométrica anual de CBT no ano de 2013.
Em relação ao limite atual de 600 mil UFC/mL, temos cerca de 21% dos produtores não conformes. Se considerarmos o novo limite de julho de 2014, de 300 mil UFC/mL, temos cerca de 32% dos produtores não conformes. Se caminharmos um pouco mais, até julho de 2016, com limite de 100 mil UFC/mL, teríamos 54% dos produtores não conformes.
Quando olhamos o limite de 2016, certamente precisamos considerar que poderá haver uma melhoria na qualidade do leite, e que a proporção de produtores não conformes, poderá ser menor daqui a 2 anos.
O fato é que esta proporção atual de 21% subirá para 32% a partir de Julho próximo.
Já no Gráfico 02, apresentamos a distribuição dos produtores em função da média geométrica anual de CCS no ano de 2013.
Em relação ao limite atual de 600 mil céls/mL, temos cerca de 24% dos produtores não conformes. Considerando o novo limite de julho de 2014, de 500 mil cels/mL, esta proporção já sobe para 34% dos produtores. Se olharmos também o novo limite de 2016, de 400 mil cels/mL, este número chega aos 45%.
Da mesma forma que CBT, quando olhamos o limite de 2016, temos que considerar uma possível melhora da qualidade. No caso de CCS, os dados de mais de 6 anos, tem mostrado nenhuma melhora, e sabemos que o controle da mastite será um grande desafio para o setor produtivo.
De forma geral podemos dizer que em Julho de 2014, teremos 1/3 dos produtores não conformes para CCS ou CBT. Daqui há 2 anos, serão metades deles.
O que falta ?
Para responder a esta pergunta, vamos observar a figura abaixo.
Quando passamos por uma estrada com uma placa como esta e a 100 km/h, o que vai acontecer ? Fácil responder, correto ? Num curto espaço de tempo, receberemos um comunicado da infração com período para indicar o condutor. Na sequencia, será emitida uma multa a ser paga pelo infrator, e o mesmo também terá uma pontuação na sua carteira de habilitação. Ainda caso ultrapasse a pontuação, poderá ter a sua licença suspensa.
Agora pergunto a vocês, o que acontece com um leite que ultrapassa o limite máximo de CBT, por exemplo ? Infelizmente nada. A legislação brasileira não prevê o que deverá ser feito nestes casos.
Ou seja, temos os limites de qualidade (que seria a “velocidade máxima”), temos um sistema de monitoramento da qualidade pela Rede Brasileira de Qualidade do Leite (que seria o nosso “radar”), mas não temos nenhuma orientação clara de que ação deve ser tomada em caso de “infração”.
Dá para imaginar o que aconteceria se tivéssemos os limites de velocidades nas estradas, com monitoramento por radar, mas sem consequência alguma para os infratores ? Certamente estaríamos ainda andando acima da velocidade máxima sem mudar o nosso comportamento. É isso o que acontece atualmente com a qualidade do leite.
Obviamente sabemos que qualidade do leite não é algo que irá se resolver da noite para o dia, e que o produtor terá de trabalhar arduamente para produzir um leite com qualidade demandando apoio técnico, recursos financeiros, etc.
Desde a publicação da IN-51, há 12 anos atrás, temos colocado que a abordagem é muito mais educativa do que punitiva. Porém, temos de avançar e definir como será este processo de melhoria da qualidade do leite e o que ocorrerá com o leite fora dos padrões.
O Plano Mais Leite do MAPA
Em Fevereiro deste ano, o MAPA publicou uma instrução normativa (No. 3 de Fevereiro de 2014) que instituiu o Plano de Incentivo à Pecuária Bovina. Este plano tem como objetivo estratégico “aumentar de forma sustentável a produtividade e competitividade da pecuária bovina de leite e corte, por meio de ações coordenadas em benefício da sociedade brasileira”.
Dentro deste plano, existe o Programa Mais Leite, que tem como meta aumentar a produção de leite em 40% nos próximos 10 anos. Isso será feito com ações distribuídas nos seguintes eixos: Melhoramento genético, Ampliação de Mercado, Incorporação de tecnologia e Segurança e qualidade dos produtos.
O eixo de Segurança e qualidade dos produtos, tem como meta a produção de leite que atenda os padrões previstos em 2016, e terá como indicador o índice de conformidade. Como diretrizes, estão previstas ações de melhoria da qualidade do leite produzido nas fazendas e melhor gestão da fiscalização, que inclui por exemplo, a modernização da legislação vigente com a revisão do RIIPOA (Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal) que é de 1952 e que não prevê, por exemplo, critérios de qualidade que constam na IN-62.
O plano é um indicativo de que o governo está se movimentando e tem claro o que precisa ser feito. Agora basta que tenhamos uma execução eficiente, não somente por parte do governo, mas por todos os envolvidos no setor produtivo.
Como diria Albert Einstein “insanidade é fazer sempre a mesma coisa várias e várias vezes esperando obter um resultado diferente”. Que possamos daqui alguns anos, estarmos tendo resultados diferentes em “benefício de toda a sociedade brasileira”.