Assim, alternativas para aumentar a proporção digestível da fração FDN da cana têm sido estudadas pela comunidade científica. Uma linha de pesquisa de interesse é testando o uso de óxido de cálcio, um produto facilmente encontrado no mercado e a preço interessante. Então, apresentaremos aqui uma pesquisa realizada com esse produto pela Universidade Federal de Viçosa em parceria com Texas University e o Southern Plains Agricultural Research Centre, nos Estados Unidos. Um estudo com animais foi realizado no Brasil, e outro estudo em laboratório foi realizado nos EUA. Os pesquisadores estudaram os tempos de 0, 24, 48 e 72 horas de exposição da cana ao produto e as concentrações de 0, 5 e 10 gramas de óxido de cálcio por quilo de matéria fresca de cana.
A hipótese se resume no fato de que ocorre uma fermentação espontânea após o corte da cana, que pode converter até metade dos açucares solúveis em ácidos orgânicos, reduzindo a qualidade da cana. Esta fermentação é acompanhada pelo aumento da temperatura na massa. A inclusão de óxido de cálcio hipoteticamente reduz o processo de fermentação durante a fase de estocagem da cana cortada fresca. Então, vamos ver se isso realmente acontece.
O estudo apontou que houve interação entre concentração de óxido de cálcio e tempo de exposição sobre as concentrações de matéria seca, matéria orgânica, proteína bruta, extrato etéreo, e sobre a temperatura da massa estocada. Entretanto, ocorreram interação para Carboidratos não fibrosos, FDN e pH.
No estudo com animais realizado na Universidade federal de Viçosa, as frações da MS e da FDN que são potencialmente degradadas no rúmen, bem como as frações indigestíveis, foram afetadas pelo nível de inclusão de óxido de cálcio, mas não pelo tempo de exposição. Mas, os estudos em laboratório nos EUA não observaram nenhum efeito dos tratamentos sobre a cinética de degradação da cana submetida aos tratamentos apresentados. As Tabelas de 1 a 3 apresentam estes dados.
Tabela 1. Efeito do tempo de exposição e do nível de óxido de cálcio sobre a composição química da cana-de-açúcar.
Tabela 2. Avaliação da interação entre tempo de exposição e nível de óxido de cálcio sobre a concentração de carboidratos da cana-de-açúcar.
Tabela 3. Cinética de degradação ruminal da cana-de-açúcar tratada com óxido de cálcio.
Observou-se que a temperatura aumentou linearmente com o concomitante aumento do nível de óxido de cálcio. A explicação possível para este aumento pode ser devido à capacidade do material de reter água, mantendo a produção de calor durante o processo de fermentação. O aumento na concentração da fração FDN pode ser devido à "lavagem" ou fermentação dos carboidratos solúveis com o aumento do tempo de exposição.
O aumento do nível de óxido de cálcio aumentou a fração insolúvel potencialmente digestível do FDN, com conseqüente diminuição da fração indigestível. O mesmo comportamento foi observado para a fração Matéria Seca.
Considerações finais
A inclusão de óxido de cálcio melhorou a qualidade bromatológica da cana de açúcar, aumentando a digestibilidade potencial das frações MS e FDN. Entretanto, os tratamentos não afetaram a taxa de passagem e os estudos de cinética ruminal realizados em laboratório não apontaram benefícios de nenhum dos tratamentos. Também, a inclusão de níveis de óxido de cálcio e os tempos de exposição afetaram negativamente a fração carboidratos não fibrosos.
Assim, olhando todo o conjunto de dados, é coerente afirmar que nenhum dos níveis de óxido de cálcio utilizado neste estudo foi capaz de prevenir por completo o processo de fermentação da cana fresca, portanto, este tema ainda requer maior atenção dos pesquisadores para a completa elucidação do problema.
Embora os dados com óxido de cálcio não sejam tão bons quanto desejamos, o estudo deste produto ainda não está completo, e possivelmente, a incorporação de novas tecnologias poderá melhorar a estabilidade e a digestibilidade da cana fresca.
Fonte:
D.S. PINA, D.S., TEDESCHIA, L.O, VALADARES FILHO, S.C., et al. Influence of calcium oxide level and time of exposure to sugarcane on in vitro and in situ digestive kinetics. Animal Feed Science and Technology, v. 153, p.101-112, 2009.