Autores
Vitor Santiago Carvalho (médico veterinário da UFBA)
Leandro Rodello (Doutor em Reprodução Animal pela Unesp Botucatu)
Cláudia Kazumi Kiya (mestranda do curso de pós-graduação em Ciência Animal nos Trópicos, UFBA)
O ectima contagioso, também conhecido como dermatite pustular contagiosa, dermatite labial infecciosa, boca crostosa ou boqueira, é uma doença infecciosa em pequenos ruminantes, provocada por um vírus do gênero Parapoxvirus altamente contagioso e que provoca lesões crostosas principalmente na boca e face do animal. Trata-se de uma zoonose, já que o vírus do ectima é prontamente transmissível ao homem. O tratamento é feito com antissépticos locais e a prevenção pode ser feita através da vacinação.
A doença ocorre em ovinos e caprinos com 3 a 6 meses de idade, porém existem relatos em animais de 10-12 dias de idade e em animais adultos. O ectima gera diminuição do desenvolvimento, graus variados de dor e certa perda econômica. Surtos podem ocorrer a qualquer tempo, porém são mais frequentes na época seca, quando os animais estão a pasto. A porta de entrada do vírus são as abrasões, desta forma a presença de alimentos grosseiros ou forrageiras que levam a lesões na mucosa oral aumenta o risco de contrair a doença. O Parapoxvirus é cosmopolita e pode permanecer infectante nas crostas presentes no ambiente ao longo de meses ou anos.
O período de incubação varia de 4 dias a 2 semanas. A taxa de morbidade pode chegar a 100%, por outro lado a de mortalidade é bem limitada (1-10%) e depende da extensão das lesões e complicações secundárias. A infecção é autolimitante e os animais recuperados ficam imunes por 2 a 3 anos. A proteção colostral parece ser incompleta.
A transmissão pode ocorrer por contato direto ou indireto. Animais jovens são mais sensíveis. O contato entre animais e com instalações, pastagens e cochos contaminados é a principal forma de disseminação da enfermidade. Outro fator importante é o confinamento de animais. O vírus pode ser transmitido ao homem, no qual se manifesta na forma de erupção muito irritante na pele. Após a introdução da doença nos rebanhos, a enfermidade se torna endêmica pela persistência do vírus por longos períodos no ambiente ou pela presença de animais com infecções persistentes. No Brasil há poucas referências da doença. Há relatos de surtos no Rio Grande do Sul e em São Paulo. No nordeste, desde a década de 1930, a enfermidade é um dos principais problemas sanitários da exploração caprina, por acometer cerca de 60% das criações.
Comumente o diagnóstico se dá através da observação dos sinais clínicos, no diferencial indica-se exame histopatológico. As lesões de pele apresentam graus variáveis podendo ser imperceptíveis ou graves. No início da doença há formação de pápulas, vesículas e pústulas, seguidas de crostas espessas que em alguns dias recobrem uma área elevada na pele e ao cair deixam a pele sujeita às infecções secundárias.
As primeiras lesões são observadas na mucosa oral, porém podem se estender ao focinho, orelhas, pálpebras e raramente ao aparelho genital ou coroa dos cascos. Mães amamentando animais com ectima podem apresentar a doença nas tetas. Tipicamente as lesões se curam dentro de 14 a 21 dias, porém podem persistir em animais imunodeprimidos. Em cordeiros, as lesões podem ser graves e provocar anorexia, perda de peso, desidratação, desnutrição e claudicação. As lesões no úbere podem resultar em mastites.
Figura 1 - Ovelhas apresentando quadro avançado de ectima contagioso, foto gentilmente cedida pela médica veterinária Byanca Ribeiro.
No tratamento das lesões, utiliza-se solução de permanganato de potássio a 3% ou solução de iodo a 10% acrescido de glicerina, na proporção de uma parte da solução de iodo para uma de glicerina. O ideal é pulverizar as áreas afetadas pelo menos duas vezes ao dia, por sete dias consecutivos, mas a aplicação a cada 48h da solução de iodo ou a auto-hemoterapia também se revelaram eficazes no tratamento da doença. Também é preciso aplicar repelentes de moscas nas bordas das feridas, para evitar o aparecimento de bicheira. Nas áreas mais sensíveis, como o úbere, as lesões devem ser tratadas com iodo e glicerina na proporção de 1:3 ou com solução de ácido fênico a 3% mais glicerina.
A doença é controlada pela vacinação sistemática. Nos casos de aparecimento da doença em propriedade onde os animais não foram vacinados, devem-se isolar os animais doentes e vacinar os demais. A imunização ativa dos ovinos e caprinos é um procedimento relativamente simples e está indicada apenas nas áreas onde ocorre a doença por tratar-se de uma vacina viva, preparada a partir de crostas contendo o vírus. Uma a duas gotas da vacina é aplicada por escarificação da pele na face interna da coxa com agulha ou estilete. Na ocorrência de um surto, a vacinação imediata do rebanho é geralmente benéfica. A vacinação confere imunidade por aproximadamente dois anos.
Figura 2 - Caprino acometido de ectima contagioso com lesões secundárias nas orelhas.
O ectima contagioso é uma zoonose altamente contagiosa e pode provocar lesões nas mãos dos tratadores e veterinários, portanto é indispensável utilização de luvas durante o tratamento, vacinação e manipulação dos animais.
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