O uso da IA acelera o melhoramento genético, facilita a realização de testes de progênie, evita a transmissão de doenças venéreas, viabiliza a obtenção de produtos de reprodutores alojados em outras regiões ou países ou até mesmo que já morreram, além de possibilitar que machos com sub-fertilidade adquirida produzam descendentes. A IA possibilita ainda, que o produtor multiplique os genótipos dentro do rebanho, a partir do uso de sêmen de diferentes reprodutores comprovadamente melhoristas, sem aumentar o número de reprodutores no plantel, ou seja, a IA possibilita o acesso a material genético superior por preço compatível. O emprego da IA permite ainda, o maior controle zootécnico do rebanho, como por exemplo, pela identificação de fêmeas que não apresentaram estro e maior controle de partos, com datas precisas. Entretanto, para que se obtenha sucesso em programas de inseminação artificial, são necessários alguns cuidados como a utilização de sêmen de boa qualidade, um bom controle sanitário e mão de obra especializada. A adequada seleção dos atributos produtivos e reprodutivos de fêmeas e principalmente dos machos é a base essencial para a maximização do potencial dessa biotécnica.
As técnicas de IA variam de acordo com o sítio de deposição do sêmen no aparelho reprodutor da fêmea, conforme esquematizado na figura 1. Assim, as técnicas de inseminação existentes são: vaginal, cervical (superficial e profunda), intra-uterina (transcervical e laparoscópica).
Figura 1: Local de deposição do sêmen e suas respectivas denominações das técnicas de inseminação: (a) Inseminação vaginal, (b) Inseminação cervical superficial, (c) Inseminação cervical profunda, (d) Inseminação intra-uterina por via transcervical e, (e) Inseminação intra-uterina por laparoscopia.
Inseminação vaginal
A IA vaginal é uma técnica simples e consiste na deposição do sêmen na vagina da fêmea o mais profundo possível, sem a preocupação de localizar e ultrapassar a cérvix. A técnica é também chamada de inseminação às cegas por não se observar o sítio exato em que o sêmen é depositado. Essa técnica requer pouco treinamento, e deve-se utilizar apenas sêmen fresco com baixa diluição, o que permite a deposição de altas concentrações espermáticas a fim de obter resultados satisfatórios.
A fêmea permanece em estação e a pipeta de inseminação é inserida na vagina, aproximadamente 13 centímetros. Esta técnica apresenta a vantagem de não requerer manipulação prolongada das fêmeas e utilizar um sistema de contenção mínimo.
Inseminação cervical
A técnica consiste na deposição do sêmen dentro da cérvix, e de acordo com a profundidade do sítio de deposição, esta é classificada como, cervical superficial ou cervical profunda.
Inseminação cervical superficial: Consiste em localizar o orifício da cérvix com auxílio de espéculo vaginal e fonte de luz, e posterior deposição do sêmen o mais profundo possível, não excedendo um ou dois centímetros após o início da cérvix. Esta técnica é bastante difundida por ser uma técnica rápida e de fácil aplicação, não requerer excessivo treinamento e pouca manipulação, com custo relativamente baixo. Em geral, utiliza-se sêmen fresco diluído ou resfriado.
Inseminação cervical profunda: Esta técnica requer a utilização de espéculo e lanterna, para visualização da cérvix, e aplicador delgado que permita a passagem através dos anéis cervicais até uma profundidade de 2 a 4 centímetros no interior da cérvix. Desta forma, é possível incrementar a fertilidade, embora necessite técnicos com maior capacidade e destreza.
A inseminação cervical profunda apresenta diferença entre as espécies, sendo mais fácil em cabras que em ovelhas, devido às particularidades anatômicas da cérvix ovina. Esta é longa, fibrosa, tubular, com lúmen bastante contorcido, possuindo de 4 a 7 anéis cervicais que funcionam como barreira física de contaminantes externos. Os anéis cervicais representam a maior dificuldade na inseminação cervical profunda e intra-uterina por via transcervical nesta espécie, pois eles se projetam para o lúmen, e o segundo e terceiro anéis estão freqüentemente desalinhados com o primeiro, resultando no direcionamento equivocado da pipeta de inseminação. Fatores como raça, idade, número de partos influenciam a forma da cérvix ovina.
No estudo desenvolvido por Kershaw et al. (2005), foi determinada a classificação da cérvix, segundo sua exposição externa, conforme apresentado na figura 3. No mesmo estudo, os anéis cervicais foram contados, e o grau de dificuldade na passagem destes, foi classificado em: Grau 1: cérvix com completo alinhamento dos anéis em direção a abertura do lúmen sem interdigitações; Grau 2: cérvix com mistura de anéis alinhados e desalinhados com uma interdigitação obstruindo o centro do lúmen e, Grau3: cérvix predominantemente incompleta com interdigitações e anéis não alinhados (figura 3).
Figura 2: Classificação relacionada à aparência externa da cérvix em ovelhas. (a) bico de pato, (b) fenda, (c) rosa, (d) papila e (e) aba. Fonte: Kershaw et al. (2005)
Figura 3: Classificação quanto à direção e à máxima profundidade de penetração em inseminação artificial em ovelhas (a) Grau 1, (b) Grau 2 e (c) Grau 3. Fonte: Kershaw et al. (2005).
De acordo com o grau de profundidade com que é depositado o sêmen, aumenta-se a eficiência da técnica, permitindo assim, redução do número de espermatozóides na dose inseminante. Geralmente, utiliza-se sêmen fresco, resfriado e com possibilidade de utilizar sêmen congelado de boa qualidade.
Uma técnica para facilitar o alinhamento dos anéis cervicais e conseqüentemente a passagem da pipeta de inseminação entre estes, é utilizar o pinçamento da parede adjacente a projeção de entrada da cérvix. Este recurso deve ser utilizado com cautela, conforme será discutido no tópico, inseminação intra-uterina por via transcervical.
Para realização da inseminação cervical profunda necessita-se de profissional especializado, pois requer ser cuidadoso para evitar perfuração da cérvix, já que movimentos bruscos podem ocasionar a deposição do sêmen na cavidade abdominal com a conseqüente baixa da fertilidade. Para tanto, a fêmea deve ser bem contida de modo a evitar movimentações que possam prejudicar a execução desta técnica. Sugere-se como forma de contenção, manter o trem posterior da fêmea elevado com auxilio, por exemplo, de um cavalete, para sua melhor imobilização.
Inseminação intra-uterina
Essa técnica consiste na deposição do sêmen diretamente no lúmen uterino, permitindo a utilização de sêmen congelado. A via natural de acesso ao útero, que seria a via transcervical é difícil na espécie ovina, devido à cérvix constituir um dos maiores obstáculos à passagem de instrumentos, por ser de difícil dilatação, ter estrutura rígida, ser longa e bastante fechada. Neste sentido, a inseminação intra-uterina por laparoscopia é há vários anos uma opção eficiente, embora atualmente a inseminação intra-uterina por via transcervical tem sido empregada, na espécie ovina, com resultados satisfatórios. Já em cabras, a cérvix apresenta menor complexidade, assemelhando-se mais com a cérvix bovina, que contém 4 ou 5 anéis que podem ser passados mediante manobras adequadas. Desse modo, para as cabras, a inseminação intra-uterina por via transcervical apresenta uma ferramenta eficiente e de fácil execução.
Inseminação intra-uterina por via transcervical: Conforme as diferenças anatômicas descritas entre as ovelhas e as cabras, a técnica de deposição de sêmen no corpo uterino por via transcervical apresenta algumas particularidades entre estas espécies.
Esta técnica requer a contenção da fêmea conforme descrita na técnica de inseminação cervical profunda, onde a fêmea é mantida com o trem posterior elevado e devidamente imobilizada, a fim de evitar lesões ou perfuração da cérvix ou útero.
Nas cabras, o orifício da cérvix é localizado utilizando-se espéculo vaginal com fonte de luz. Para melhor posicionamento e facilidade de transposição dos anéis cervicais, sugere-se o pinçamento da parede adjacente a projeção externa da cérvix, sem necessidade de tracionamento cervical. A técnica de pinçamento deve ser realização com cuidado e adequado treinamento, evitando o fechamento da abertura cervical ou ainda, lesão no fundo de saco vaginal. Nesta espécie, a abertura cervical durante o estro possibilita a passagem fácil da pipeta de inseminação e a deposição do sêmen no corpo uterino.
Em ovelhas, devido ao desalinhamento de seus anéis cervicais, além dos procedimentos descritos para cabras, há necessidade de tracionamento da cérvix, com auxilio de duas pinças fixadas lateralmente a projeção externa da cérvix. Entretanto, este procedimento deve ser realizado com a máxima cautela, respeitando os limites anatômicos de cada animal. Com a cérvix tracionada é possível, com o auxilio dos dedos, manipulá-la e passar a pipeta pelo canal cervical até alcançar o corpo uterino. Atualmente, há a disposição no mercado uma pipeta de inseminação ovina com função de expansor, o que tem permitido maior percentual de transposição da cérvix nesta espécie.
Devido cada animal apresentar um grau de dificuldade, sugere-se respeitá-los e não forçar a transposição de todos os anéis cervicais. Assim, conforme o grau de dificuldade, a dose inseminante não necessariamente deve ser depositada no corpo uterino, evitando manipulação excessiva que possa comprometer a eficiência da técnica no momento, e ainda, afetar a fertilidade futura da fêmea.
Esta técnica deve ser realizada por profissionais devidamente especializados e sua indicação na espécie ovina é principalmente para fêmeas adultas e pluríparas.
Inseminação intra-uterina por laparoscopia: Esta técnica consiste na deposição de pequenas quantidades de sêmen ou ainda em menor concentração espermática, diretamente nos cornos uterinos via procedimento cirúrgico de laparoscopia.
Para a realização desta técnica, a fêmea é mantida em decúbito dorsal em maca específica, com a inclinação de 45º a 60º da porção da cabeça mais baixa. Em resumo, após os procedimentos anestésicos e de anti-sepsia, é feita a incisão e introdução do primeiro trocater com sua cânula, seguindo-se a insuflação do abdome com CO2, para posterior introdução do segundo trocater e cânula. O endoscópio é inserido através da cânula de insuflação, e a pipeta de inseminação é inserida através da segunda cânula. A deposição do sêmen é realizada na porção médio-distal de cada corno uterino, não sendo necessário verificar os ovários para determinar o lado da ovulação.
Por esta técnica exigir a utilização de equipamentos específicos e profissional especializado, seu custo é mais elevado que as demais técnicas de inseminação. Entretanto, tem permitido notáveis avanços no uso de sêmen congelado, especialmente em ovinos, e grandes vantagens, como a maior amplitude de intervalo entre o estro e a inseminação, diminuição do número de espermatozóides por dose inseminante, de modo a possibilitar maior rendimento dos ejaculados e ainda, melhores taxas de prenhez.
Conclusões
O local de deposição do sêmen no momento da IA é um fator bastante estudado em ovinos e caprinos, pois é de suma importância para a obtenção de bons resultados de fertilidade. Pois, com a monta natural ou inseminação, os espermatozóides tem que migrarem pelo útero até o oviduto, local onde ocorre a fecundação e devido a este fato, é importante que o sêmen apresente boa concentração e qualidade. Do mesmo modo, a determinação do momento da ovulação é crucial para o sucesso da inseminação. Portanto, o objetivo do programa é fazer com que os espermatozóides atinjam o oviduto e encontrem um oócito (gameta feminino) viável. O que influencia a escolha desse momento é a opção por determinada técnica de sincronização ou utilização de estro natural, a técnica de inseminação usada, o tipo de sêmen e a manipulação dos animais. Esses fatores serão discutidos na seqüencia de artigos publicados por este radar técnico do site Farmpoint.
Literatura consultada:
Chemineau, P.; Cognié, Y. Training manual on artificial insemination in sheep and goats. INRA, FAO, France, 222 p., 1991
Ferra, J. C.; Sereno, J. R. B. Inseminação Artificial em Ovinos. Documento 156, Embrapa Cerrados, Planaltina-DF, 2006
González, R. S.; Hernández, J. A. M. Reproducción de ovejas y cabras. UNAM Cuautitlán. 1ª Edição, México, 335p., 2008
Kershaw, C. M.; Khalid, M.; McGowan, M. R.; Ingram, k.; Leethongdee, S.; Wax, G.; Scaramuzzi, R. J. The anatomy of the sheep cervix and its influence of the transcervical passage of an inseminating pipette into the uterine lumen. Theriogenology, New York, v. 64, p.1225-1235, 2005
Mies Filho, A. Inseminação Artificial. 6 a edição. Porto Alegre: Sulina, 750p., 1987