Embora seja uma atividade antiga em nosso país, a caprinocultura ainda não possui profissionalização adequada, dificultando a viabilidade econômica e eficiente dos criatórios. A sanidade do rebanho é um dos principais entraves encontrados nas propriedades, sendo a artrite-encefalite caprina, uma das doenças mais alarmantes.
A síndrome artrite-encefalite caprina (CAE) trata-se de uma doença multissistêmica crônica dos caprinos causada por um vírus pertencente à família lentivirinae. Atinge diretamente a produtividade do rebanho, pois os animais infectados apresentam queda na produção leiteira e diminuição do desempenho reprodutivo, ocasionando altas taxas de descarte na propriedade. A infecção com o vírus é bastante disseminada não tendo prevalência sobre raça ou idade.
A principal manifestação clínica é a poliartrite crônica.
Foto 1. Caprino infectado pelo vírus da CAE apresentando a forma clínica articular da enfermidade: artrite da articulação do carpo
A doença pode ser transmitida de forma "vertical" e "horizontal", por meio do contato de um animal sadio com as secreções de um animal acometido. A transmissão vertical ocorre em cabritos ainda na sua fase intra-uterina. Também pode ocorrer durante o parto (contato com secreções vaginais, saliva, ou até mesmo secreções respiratórias da mãe infectada) ou após o parto (ingestão do colostro de uma mãe soropositiva).
A transmissão horizontal acontece quando animais infectados são confinados com caprinos não-infectados, fazendo com que estes manifestem rapidamente uma soro-conversão, principalmente quando as cabras são ordenhadas no mesmo local. Há relatos de animais que se tornaram soropositivos pela via venérea ou pelo contato com instrumentos de manejo e ordenha contaminados.
Uma vez infectados, permanecem doentes por toda vida, porém, apenas alguns animais desenvolvem manifestação clínica. As lesões oriundas dessa enfermidade são de origem linfática, causando síndrome multissitêmica, a qual envolve o tecido conjuntivo articular, resultando em artrite crônica, tumefação e endurecimento das glândulas no úbere (com ou sem mastite) e pneumonia intersticial crônica.
A maioria dos animais infectados permanecem assintomáticos. Entretanto, quatro síndromes clínicas estão associadas à esta doença: artrite; leucoencefalomielite; pneumonia intersticial e mastite.
Dentre os achados clínicos são encontrados problemas nas articulações dos animais como a artrite, que se estabelece de forma súbita, uni ou bilateral, acometendo as articulações do carpo e do tarso. A artrite pode ser acompanhada por um aumento de volume e endurecimento do úbere, bem como uma pneumonia intersticial.
Foto 2. Caprino infectado pelo vírus da CAE apresentando a forma clínica articular da enfermidade: artrite da articulação do carpo
Nos achados de radiografia são encontradas tumefações nos tecidos moles (estágios iniciais) e calcificação dos tecidos periarticulares e produção de osteófitos - prolongamentos ósseos - (estágios finais). O líquido sinovial (que lubrifica as articulações) encontra-se de coloração castanha, com redução do teor de proteína e aumento na quantidade de células (90% de linfócitos).
A manifestação nervosa acomete, principalmente, cabritos de um a cinco meses de idade. Esta caracteriza-se por paresia dos membros posteriores uni ou bilateral e ataxia (incoordenação). Pode ocorrer "sacudida" de cabeça e andar em círculo. O animal tende a progredir no quadro permanecendo no estágio de tetraparesia. O líquido cérebro-espinhoso possui uma quantidade aumentada de células mononucleares.
Cabrito infectado pelo vírus da CAE apresentando a forma clínica nervosa da enfermidade: tetraparesia
O diagnóstico é feito através dos sintomas e provas sorológicas, Elisa e PCR. No estágio inicial recomenda-se o teste de imunodifusão em ágar gel (AGID), o qual possui alta especificidade e sensibilidade, além de baixo custo.
Não há alteração no hemograma e nos testes bioquímicos do soro sanguíneo, podendo haver discreta anemia em alguns animais. Não há tratamento específico e os sintomas dos animais acometidos tendem a se agravar com o decorrer do tempo.
O descarte é recomendado visto que o animal é uma fonte de infecção. Algumas medidas profiláticas podem ser tomadas para o controle da enfermidade:
Animais recém-nascidos:
• Devem ser separados da mãe logo ao nascimento para evitar a ingestão do colostro e lambedura;
• Devem ser separados dos animais mais velhos e receber colostro à temperatura de 57ºC durante uma hora (a esta temperatura o vírus é inativado e as imunoglobulinas permanecem íntegras);
• Devem permanecer isolados e criados com leite de cabra ou vaca pasteurizado (74ºC durante 15 seg.) ou com substituto do leite.
Em propriedades onde os machos serão descartados ou abatidos após o nascimento, pode-se instituir o seguinte manejo:
• Utilizar colostro e leite de vaca para as fêmeas até a desmama, sendo que os machos serão alimentados com colostro e leite das cabras (pois serão descartados);
• Exame semestral de todo o rebanho deve ser efetuado na propriedade, sendo recomendado o descarte dos soropositivos;
• Deve-se fazer quarentena de animais adquiridos;
• Em reprodutores, fazer exame semiológico durante os primeiros 60 dias de permanência na nova propriedade;
• A desinfecção nos equipamentos utilizados é necessária, utilizando compostos fenólicos ou de amônio quartenário.
Referências:
Clínica de ovinos e caprinos - D.G. Pugh - ed. ROCA, 2005
Clínica Veterinária - Um Tratado de Doenças dos Bovinos, Ovinos, Suínos, Caprinos, e Eqüinos - Blood C. Douglas; Otto M. Radostits; Clive C. Gay; Kennethy W. Hinchcliff - ed. Guanabara, 2002.
Avaliação da taxa de ocorrência da artrite encefalite caprina a vírus pelas regionais do escritório de defesa agropecuária do Estado de São Paulo, Brasil, e seu mapeamento por meio de sistema de informações geográficas - B.L.S. Leite1, J.R. Modolo1, C.R. Padovani2, A.V.M. Stachissini1, R.S. de Castro3, L.B. Simões2
Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, UNESP, CP 524, CEP 18618-000, Botucatu, SP, Brasil, 2004.