Consciente das perdas e da falta de informações didáticas sobre as onfalopatias, freqüentemente encontradas nos rebanhos bovinos do Brasil, o Prof. Luciano Figueiredo da Universidade Federal da Bahia, publicou um livro sobre o assunto. Neste artigo, relatamos algumas das informações contidas nesta obra.
Antes de abordar as enfermidades associadas ao umbigo é interessante conhecer sua função e a seqüência de fatores que ocorre com esta estrutura após o momento do parto.
Durante a gestação, é o cordão umbilical que liga o feto à placenta, garantindo a chegada de sangue arterial e a saída do sangue venoso. O cordão umbilical é formado por 2 artérias, 1 veia e o úraco; sendo que a veia umbilical dirige-se cranialmente em direção ao fígado, as artérias dirigem-se à região hipogástrica e o úraco em direção à bexiga (Figura 1).
Na ocasião do parto o cordão umbilical se rompe. Neste momento, devido à forte pressão da musculatura abdominal e presença da bainha peritoneal dos vasos, as artérias e o úraco são retraídos para dentro da cavidade, enquanto que a veia fica fixada ao anel umbilical. Geralmente, em partos normais, o segmento exposto do umbigo possui cerca de 10 cm. Entretanto, deve-se destacar que não existe nos bovinos um ponto exato para a ruptura do cordão, fato este que justifica a variação do seu tamanho. Durante os primeiros dias de vida, enquanto o umbigo está exposto às contaminações do ambiente, ele representa a maior e mais importante porta de entrada de microorganismos no neonato.
A atrofia do ducto venoso e arterial, bem como o fechamento do forame oval ocorre poucos dias após o parto O úraco também se retrai, passando sua função a ser desempenhada pela uretra. Entretanto, quando o úraco não se fecha totalmente, pode ocorrer a persistência do mesmo, patologia que ocasiona o aparecimento de gotas de urina na região umbilical.
Nas condições desejáveis, ou seja, quando o parto é normal, a ruptura e as retrações acontecem de forma compatível e as condições higiênicas de manejo e ambientais são boas, o umbigo inicia o processo de secagem da bainha amniótica a partir das 8 horas de vida, a mumificação e queda séptica do umbigo ocorrem dentro de 10 dias. Todavia, em condições desfavoráveis (partos distócicos, ruptura e retração anormal, falhas na desinfecção do umbigo e / ou ambiente contaminado) ocorrem os problemas umbilicais, onde os vasos e seus envoltórios constituem a porta de entrada e o meio de cultura ideal para o desenvolvimento de patógenos que causam as infecções umbilicais.
Existem problemas associados ao umbigo de cunho infeccioso e não infeccioso. As hérnias, os fibromas e as persistências fazem parte dos processos não infecciosos que acometem o umbigo. As hérnias umbilicais são um dos mais comuns defeitos congênitos em bovinos. Mas, não se deve atribuir sua causa somente à genética; o meio ambiente e a presença de alterações infecciosos no umbigo também podem contribuir para sua ocorrência. Dados de pesquisa apontam que as fêmeas são mais predispostas ao problema, com cerca de 77% dos casos. Geralmente, o conteúdo do saco hernial pode conter alças intestinais, peritônio e até mesmo parte do abomaso (Figura 2). Pode-se encontrar hérnias de diferentes graus de severidade: hérnia simples, hérnia acompanhada de abscesso, hérnia acompanhada de infecção no cordão umbilical (na maioria das vezes com aderências) e hérnia fistulada com extravasamento de conteúdo gastro-intestinal. O tratamento das hérnias é a correção cirúrgica realizada por um veterinário.
O Fibroma é uma massa de tecido conjuntivo com consistência fibrosa que surge nos casos onde a cicatrização do umbigo sofreu um processo anormal (traumatismo, uso de produtos não recomendados para a desinfecção do umbigo, ...). O fibroma também deve ser retirado cirurgicamente.
A Persistência do úraco, também conhecida como úraco pérvio, ocasiona um coto umbilical constantemente úmido ou até mesmo o gotejamento de urina no abdômen ventral (e/ou tumefação na área umbilical). A oclusão imprópria do úraco pode ser simples ou pode ser secundária a problemas infecciosos do umbigo. Neste caso, ela pode também envolver o úraco interno, condição que inspira cuidados e pode levar o animal a um quadro de peritonite. O úraco pérvio deve ser corrigido por ligadura ou cauterização.
Dentre os problemas que acometem o umbigo, de cunho infeccioso, pode-se destacar os processos infecciosos extra-abdominais: as onfalites, e os processos infecciosos intra-abdominais que podem ascender para diferentes órgãos, dentre estas onfalopatias pode-se destacar: onfaloflebite, onfaloarterite, uraquite, onfaloarterioflebite, onfalouracoflebite, onfalouracoarterite e panvasculite umbilical. Todas as onfalopatias infecciosos serão abordadas no próximo artigo
Figura 1- Modificações da circulação fetal e pós-parto
Figura 2 - Saco hernial com parte do abomaso
Figura 3 - Bezerro com umbigo comprometido
Fonte:
FIGUEIREDO, L.J.C., Onfalopatias de Bezerros, Salvador: EDUFBA, 1999. 94p.
BAXTER, G.M. Umbilical masses in calves: diagnosis, treatment, and
complications. Compend. Contin. Educ. Prat. Vet. v.11, n.4, p.505-513, 1989.
SHEARER, A.G. Internal navel abscesses in calves. Vet. Rec. v.118, p.480-1, 1986.