O sistema agroindustrial leiteiro é caracterizado como oligopólio, em que a concorrência é imperfeita, havendo excesso de fornecedores de insumo (leite) em relação às indústrias que compram a matéria-prima (BICALHO et al., 2008). A estrutura de mercado é considerada atomizada devido à pulverização da produção nas diferentes regiões do país com participação de pequenos, médios e grandes produtores (Barros et al., 2010). O presidente de uma associação de produtores de leite da região de Juiz de Fora em Minas Gerais relatou que 90% dos associados eram pequenos pecuaristas com produção de leite diária variando de 50 a 80 litros (BICALHO et al., 2008).
A produtividade ainda é muito baixa, sendo que 94% das fazendas representam apenas 32% da produção nacional com média abaixo de cinco litros por vaca por dia. Apenas 1% das propriedades apresentam produtividade superior a 10 litros por vaca por dia, representando 29% da produção total brasileira (Rodrigues, 2008).
Em contrapartida, é possível elevar a produtividade utilizando tecnologias desenvolvidas em institutos de ensino, pesquisa e extensão, assim como melhorando a gestão das propriedades e agregando valor ao leite por meio de cooperativas e de indústrias, pois a qualidade da matéria-prima é essencial para a conquista de mercados externos e para a consolidação do interno. Em dez anos, a produção brasileira de leite aumentou aproximadamente 8,4 bilhões de litros. Devido a esta elevação de produção, a balança comercial no mercado leiteiro foi invertida pela primeira vez em 2006, exportando mais do que importando (Rodrigues, 2008).
Atualmente, o Brasil é considerado o sexto maior produtor de leite do mundo (27,5 bilhões de litros), ficando atrás dos Estados Unidos (86,1 bilhões de litros), Índia (44,1 bilhões de litros), China (35,8 bilhões de litros), Rússia (32 bilhões de litros) e Alemanha (28,6 bilhões de litros) (FAO, 2008). A produção leiteira brasileira concentra-se nos estados de Minas Gerais, Goiás, Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo (Barros et al., 2010).
A relação entre produtor de leite e indústria laticinista
Os produtores, compostos por uma maioria de pequenos extrativistas leiteiros, possuem baixo acesso à informação e à contratação de capital à taxa de juros acessíveis. Sob essas restrições, ficam impossibilitados de variar sua produção, de ampliar e de diversificar seu mercado. Devido a essas limitações e a organização do setor leiteiro do agronegócio, os produtores resignam-se às demandas e ofertas das indústrias que impõem seus interesses. Segundo o presidente de uma associação de pecuaristas leiteiros da região de Juiz de Fora, Minas Gerais, a relação entre indústria laticinista e produtor de leite é caracterizada pela ausência de negociação, em que a indústria geralmente remunera o produtor no 20º dia do mês informando o preço e a quantidade de leite recolhida no mês anterior (BICALHO et al., 2008).
Na tentativa de formalizar a comercialização do leite entre produtores e laticínios, alguns programas governamentais, como o Pró-Leite da Prefeitura de Juiz de Fora, MG, incentivam o associativismo dos produtores de leite e a instituição de contratos formais com preços e volumes de leite a serem pagos e fornecidos explícitos, respectivamente, garantindo maior controle financeiro dos produtores e fidelidade destes com as indústrias (BICALHO et al., 2008).
A pulverização da produção leiteira eleva os custos de captação e armazenamento do leite. No entanto, tem ocorrido aumento na captação de leite cru para processamento devido ao crescimento da participação de pequenas empresas no mercado. As empresas maiores têm perdido receita em detrimento de perdas de pequenas parcelas do mercado para as empresas menores (Barros et al., 2010).
As empresas hoje têm sistemas próprios de bonificações e descontos, sendo seu preço final resultado de uma política leiteira. As empresas de médio e grande porte adotam a estratégia de que não pode faltar leite nas indústrias, o que faz que as empresas disputem entre si produtores com maiores volumes e qualidade. Cada indústria tem a liberdade de pagar o que achar necessário. Por exemplo, um determinado produtor pode receber mais para viabilizar a linha em que se encontra: é ele que torna viável a coleta do leite dos pequenos produtores que estão nessa rota de leite, sendo que, no final a indústria tem um preço médio adequado a seus custos pelo qual o produto é adquirido. Acerca de 34% das cooperativas amostradas no Brasil pagam por volume e acerca de 55% das cooperativas utilizam o critério volume e qualidade na remuneração dos produtores (Sbrissia& Barros, 2008). A Figura 1 e a Tabela 1 ilustram essa distribuição.
A Secretaria de Agropecuária e Abastecimento da Prefeitura de Juiz de Fora desenvolveu um mecanismo de remuneração ao produtor de leite baseado no preço médio mensal de varejo do leite. As usinas beneficiadoras de leite e as associações de produtores definem os preços do leite cru em contratos como uma percentagem, que oscila entre 45 e 54%, do preço médio mensal de varejo do leite (BICALHO et al., 2008).
Fonte: Sbrissia e Barros (2008)
Figura 1 - Representação percentual do pagamento por qualidade, por volume e por qualidade e volume em alguns estados brasileiros.
Tabela 1 - Formas de pagamento aos produtores de leite (%) em diferentes estados do Brasil
Um pool formado na região de Castro pelas cooperativas Castrolanda e Batavo, no estado do Paraná, foi pioneiro na utilização de padrões de qualidade na remuneração do leite ao produtor e adotam, desde junho de 2000, um sistema de pagamento no qual o preço final está baseado em um programa de qualidade que considera teor de gordura, teor de proteína, contagem bacteriana, temperatura do leite no momento da coleta, crioscopia (presença de água no leite), presença de antibiótico e contagem de células somáticas, sendo este último o indicador de maior impacto no preço final. O sistema de pagamento parte de um preço-base sobre o qual incidem premiações e/ou descontos por qualidade, mais uma bonificação pelo volume entregue. As análises são realizadas com todos os produtores, duas vezes por mês, por meio de amostras coletadas nos tanques. O estímulo à melhoria da qualidade valoriza o produto, traz ganhos de produtividade e redução de desperdício na produção, na indústria e no varejo (Sbrissia& Barros, 2008).
Referências
Barros FLA, de Lima JRF, Fernandes RAS (2010) Análise da estrutura de mercado na cadeia produtiva do leite no período de 1998 a 2008. Revista de economia e agronegócio, 8, 22.
BICALHO RDA, MACHADO MCDS, PAÇO-CUNHA E (2008) ESTUDO DAS RELAÇÕES LATICÍNIOS - PEQUENOS PRODUTORES NA REGIÃO DE JUIZ DE FORA. In: 46º Congresso da Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural, Rio Branco, Acre, Brasil.
FAO (2008) https://faostat.fao.org/site/569/default.aspx#ancor. Rome.
Rodrigues R (2008) Depois da tormenta, São Paulo, São Paulo, Brasil.
Sbrissia GF, Barros GSAdC (2008) Sistema Agroindustrial do Leite: formas de pagamento e bonificações por volume. In: 46º Congresso da Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural, Rio Branco, Acre, Brasil.