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Não existe almoço de graça

POR MARCELLO DE MOURA CAMPOS FILHO

ESPAÇO ABERTO

EM 16/10/2008

4 MIN DE LEITURA

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Em 2002, li no MilkPoint artigo "Quem vai pagar a conta?", onde o autor, defendendo o liberalismo econômico e a economia de mercado, se mostrava preocupado que com o processo eleitoral em curso, candidatos assumissem propostas que pudessem resultar numa intervenção do governo na economia, como a adoção de tarifas seletivas e subsídios para setores que considerassem estratégicos, e citava uma expressão muito comum nos USA "there is no free lunch" - não existe almoço de graça! E mostrava que se o setor que recebeu o benefício não pagou a conta do almoço, quem vai pagar é a sociedade. De fato, nesse particular, o autor estava coberto de razão quando dizia que se algum setor foi beneficiado pelo Governo e não pagou o custo desse benefício, quem vai pagar é a sociedade.

Reflitindo sobre esse artigo, e por acreditar que na economia globalizada, com um G7 da vida e a concentração do poder econômico em um número cada vez mais restrito de grupos, uma certa dose de intervenção é necessária, publiquei no MilkPoint também em 2002 o artigo "A virtude não está nos extremos", onde expressava o meu pensamento que era necessário conciliar economia de mercado e intervenção estatal para se ter equilíbrio e compensar as distorções de poder econômico entre países e grupos econômicos.

Neste momento em que os bancos centrais de várias partes do mundo tiveram que injetar mais de US$ 3 trilhões, e se cogita injeções adicionais, na tentativa de segurar uma crise mundial e profunda recessão, provocado por um liberalismo econômico desenfreado e desregulamentado, me volta a mente essa pergunta: quem vai pagar a conta? Talvez uma parte venha a ser paga pelos bancos que provocaram a crise, mas o mais provável é que, como sempre acontece, que a maior parte seja paga pela sociedade. Mas de qualquer forma, mesmo que a sociedade pague a maior parte dessa conta, acredito que a medida foi necessária, pois caso contrário seria elevada a probabilidade de estourar uma recessão mundial, e o desastre seria tão grande que a conta para a sociedade seria muito mais salgada.

Na economia existem correntes extremadas, os que pregam um liberalismo total e acreditam que o livre comércio resolverá todos os problemas, e os que acreditam que só uma intervenção estatal resolverá os problemas.

Mas os fatos estão aí para comprovar que os extremos não funcionam: crise de 1929, queda do mundo comunista, crise de 2008.

Na Carta Capital de 15 de outubro, na secção "Nós e o Mundo" é colocado "Sobre o tal neoliberalismo, só cabe discutir o preço do enterro". Mas na mesma edição, Delfim Neto faz o contraponto, quando afirma que a causa desta crise não é o neoliberalismo em si, mas a falta de regulação, ou pior, a desregulação descuidada e ideologicamente alimentada dos últimos 20 anos. E Delfim sugere que em vez de se optar pela destruição da atual organização social e econômica, que teve importância na aceleração do crescimento do mundo, é melhor dar ênfase no combate à desregulamentação radical que se revelou concretamente perniciosa.

Por tudo isso, continuo com São Tomas de Aquino: a virtude não está nos extremos. Acredito que os problemas econômicos e sociais podem ser resolvidos pelo mercado e pelo livre comércio, porém é necessária dose de regulação dos Governos. E a intervenção governamental em determinadas situações é necessária, mesmo que a sociedades pague parte do almoço, pois a omissão do governo e a crença de que o mercado desregulamentado resolve tudo pode gerar crises de proporções, tais como a que agora vivemos, de forma que o almoço vira banquete com a conta muito mais indigesta para a sociedade.

E só depois de muita oscilação das bolsas e do dólar, quando o mundo confiar que a crise financeira ficou totalmente sob controle com o almoço oferecido aos bancos e especuladores financeiros, que certamente não pagarão toda a conta desse banquete, é que veremos quanto custou a brincadeira e a parte da conta que a sociedade e os produtores terão que pagar.

Quando McCain bombasticamente anunciou que abandonava a campanha e ia para Washington ajudar a solucionar a crise que ameaçava ruir o sistema financeiro dos USA e convidou Obama para fazer o mesmo, Obama disse não abandonaria a campanha mas que iria ajudar, mas anunciou que sua posição é que todo o recurso transferido para os bancos deveria ser devolvido depois da crise solucionada para que a sociedade e a economia real dos USA não pagasse a conta do banquete.

O banquete para conter, ou minimizar uma recessão mundial vai ficar caro. A sociedade e produtores, enfim, todos que fazem parte da economia real, devem ficar espertos para não acabar pagando a maior parte da conta astronômica desse almoço oferecido para minimizar as conseqüências da farra irresponsável da economia da fantasia financeira e da omissão dos governos, e exigir medidas reguladoras e intervenção do estado que garantam que possa existir uma economia de mercado livre da irresponsabilidade e ganância de grupos econômicos.

MARCELLO DE MOURA CAMPOS FILHO

Membro da Aplec (Associação dos Produtores de Leite do Centro Sul Paulista )
Presidente da Associação dos Técnicos e Produtores de Leite do Estado de São Paulo - Leite São Paulo

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MARIA LUCIA ANDRADE GARCIA

BELO HORIZONTE - MINAS GERAIS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 17/12/2008

Prezado Marcos: sua carta ao Marcelo fazendo referência a minha "clarividência" quanto à questão da relação do produtor de leite - indústria me leva agradecê-lo pela deferência bem como aplaudi-lo pela colocação do problema em termos do Direito Econômico e do Código Civil. O setor de leite in natura constituiu no Brasil esse mercado "oligopsônico", concentrado de um lado pelas empresas que compram o leite e vendem lácteos e do outro, pelos produtores super dispersos que vendem o leite. O que faz com que a fixação e a comunicação do preço do leite fiquem ao arbítrio exclusivo da indústria, obrigando o produtor entregar o produto - uma vez que não tem como estocá-lo - ou vendê-lo para outra indústria que procederá da mesma maneira.

O fato da subida e a descida dos preços dos lácteos no comercio ser desproporcional à subida e descida do preço pago ao produtor seria outra distorção passível de indicar, não apenas a concentração, mas também a cartelização nas pontas da compra do leite e da venda dos lácteos. A rentabilidade dos elos da cadeia produtiva distribui-se entre a indústria e o comercio em detrimento da produção primária. Essa consegue quanto muito uma "renda", que dificilmente podemos chamar de lucro, já que incapaz de bancar o investimento, condição essencial à manutenção e crescimento de qualquer negócio. Isso a meu ver seria o que mais impede a modernização do setor comparativamente aos outros setores do agronegócio brasileiro.

O fato de o preço ser um dos elementos fundamentais de validação jurídica de um contrato comercial, definido de antemão, também exige, a meu ver, que sua modificação seja não apenas anunciada de antemão, mas pactuada. Pois pelo que entendi de suas colocações, o cerne do problema no caso do leite in natura é a definição unilateral do preço pela indústria, caracterizada como "potestatividade de clausula", vedada pelo Código Civil. Penso como o Marcelo que o fornecimento do leite in natura, ainda que não contratado formalmente, pela sua reiteração, documentação de fornecimento e pagamento, pode ser caracterizado como contrato para fins de ações jurídicas. O que impede que essas ações sejam tomadas é ainda a meu ver o temor do produtor, impotente em todos os sentidos - que você chamou de hipossuficiência - de ser desqualificado como produtor e fornecedor para outra indústria, uma vez que elas normalmente mantêm combinação entre si não só quanto a preços mas quanto aos produtores. Um temor semelhante ao que presenciei na minha região, quando lá cheguei há mais de 40 anos, em relação à marginalização dos empregados rurais que recorriam à justiça trabalhista. A "sociedade informal dos fazendeiros" proibia sua recontratação na região e de tal forma que tinham que buscar outro trabalho fora.

Esse é um aspecto que tem que ser avaliado, embora as oportunidades de venda do leite cresceram independente das praticas de abaixamento conjunto dos preços pelas captadoras a qualquer falseamento do planejamento ou do "mercado".

<b>Resposta do autor:</b>

Prezada Maria Lucia A. Garcia

Na situação atual realmente o produtor tem medo de qualquer ação contra lacticínios, pois como os compradores são limitados e não tem amparo na lei, tem medo de retaliação e não ter para quem vender seu leite. Por isso penso que é chegada a hora de um projeto de lei caracterizando os pontos minimos que deverão ser observados nesses contratos tacitos, inclusive pena se ficar caracterizado retaliação a produtores que acionaram compradores exigindo seus direitos previsto em legislação específica para tal fim. Acredito que uma lei regulamentando esses contratos tacitos, não só protegerá o produtor de eventuais abusos por parte da indústria, mas prootegerá também a indústria que também terá direitos, e melhorará muito a relação comercial entre produtores e indústria, e poderá ser também instrumento que favorece o ajuste da oferta e procura, favorecendo o planejamento da produção e evitando excessos de produção que a todos prejudica.
MARCOS ALMEIDA JUNQUEIRA REIS

LEOPOLDINA - MINAS GERAIS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 14/12/2008

Peço licença para acrescentar pontos ao ponto de vista da sra. Maria Lúcia Garcia, que, diga-se de passagem, traduz grande clarividência. Como sou, além de produtor, advogado, repasso meu ponto de vista jurídico a respeito da forma como nosso leite é "vendido". Em primeiro lugar, não precisamos recorrer à analogia para nos enquadramos como consumidores, em razão da hipossuficiência frente à indústria. A situação é regulada pelo Direito Econômico, sendo certo que nos situamos em um mercado "oilgopsônico", que se caracteriza por um mercado concentrado no vetor comprador e pulverizado no vetor vendedor, situação esta que se agravou com o recente movimento de concentração do setor lácteo.

Pessoalmente, já enviei minuta de ação judicial ao meu sindicato, onde se coloca tal situação e se pede que a indústria divulgue antecipadamente o preço do leite pago, pois a situação, como existente, traduz clara utilização de posição dominante pelas indústrias, de somente divulgar o preço após a realização do período fornecido. Outro ilícito de direito econômico perpetrado tem a ver com os percentuais de subida e descida dos preços. Observe a média de preços no atacado, e veja que as nossas descidas são maiores quando o preço cai e nossas subidas são, ao contrário, menores, quando o preço sobe. Isso traduz alteração artificial de mercado, utilizando-se de sua posição dominante para alterar artificialmente sua margem de lucro.

Outro ilícito claro quanto à questão da divulgação posterior dos preços de leite se liga ao fato que, juridicamente, o contrato de compra e venda exige os seguintes elementos: sujeitos capazes, objeto lícito e preço. Ou seja, preço tem relevância jurídica fundamental, inexistindo contrato sem preço. Quando o preço pode ser definido unilateralmente, existe o que juridicamente chamamos de "potestatividade de cláusula", vedado pelo Código Civil. O que existe, em verdade, é que os riscos são todos transferidos ao produtor, pois a indústria somente define seu preço quando já configurados os resultados. Francamente, um absurdo. Ou mais ou menos como o posto de gasolina somente dizer à distribuidora quanto lhe pagará pelo litro de gasolina depois de efetivar todas as vendas do mês. Francamente...

Sinceramente, não entendo como o corpo jurídico da CNA não se atenta a tais fatos. Chega. Temos que efetivamente contrrolar os preços de nosso mercado, com a impositiva divulgação, antecipada, dos preços do litro de leite.

<b>Resposta do autor:</b>

Prezado Marcos Almeida Junqueira Reis

Não sou advogado mas evidencia-se mesmo para um leigo que embora as indústrias de forma geral não pratiquem contratos formais com os produtores, as relações comerciais entre produtores de leite e a indústria que compra o leite em natura caracterizam um contrato tácito que precisa ser regulado por lei. Ora se a indústria não tem interesse em regulamentar esse relacionamento através de legislação, evidentemente que a iniciativa tem que partir dos produtores.

Estou, junto com a Maria Lúcia Garcia, estudando o envio de sugestão à CNA para encaminhamento de projeto de lei que caracterize os pontos basicos do relacionamento comercial de produtores de leite e indústria que devem ser observados na ausência de contratos formais, e nossa intenção é discutir essa sugestão com produtores interessados. Se quiser nos ajudar nesse trabalho, envie seu e-mail e telefone de contato para leitesaopaulo@mpc.com.br

Marcello de Moura Campos Filho
Presidente da Leite São Paulo
MÁRCIO F. TEIXEIRA

ITAPURANGA - GOIÁS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 13/11/2008

Prezado Marcello,

Muito boas as suas colocações. Acredito que o caminho seja, de fato, por ai.

Infelizmente existe no Brasil uma falsa idéia de que o campo está muito bem e a sociedade acredita nisso porque a mídia coloca assim. Na verdade quem faz a produção crescer e bater seus recordes é, principalmente, a iniciativa privada que possui seus mecanismos próprios de comercialização e de orçamento e não dependem do governo para nada.

Os produtores rurais brasileiros amargam um endividamento gigantesco, o crédito produtivo do Pronaf (15 bilhões por ano), por exemplo, não tem nenhum controle de fiscalização e os desvios e a não aplicação, principalmente nos projetos de reforma agrária, é uma realidade que ninguem fala. A assistência técnica estatal está falida e bons técnicos no campo já são raridade, porque é muito melhor ser concursado e ficar no ar condicionado esperando o pagamento.

Todos os assuntos são voltados ao consumidor que, é claro, merece uma alimentação barata e de qualidade, mas é injusto que aqueles que estão na roça, no sol, na chuva, levantando de madrugada de domingo a domingo paguem o banquete, como sempre pagaram.
Diante disso, na minha visão de produtor, agrônomo e cooperado de uma cooperativa de agricultores familiares, o maior problema de todos é que não temos quem nos defenda e coloque em prática o dever de casa, muito bem sugerido por você. A CNA, que pagamos anualmente, deveria ter essa função, mas é uma entidade ausente e que não toma nenhuma iniciativa concreta para resolver os problemas.

Realmente ser produtor no Brasil, principalmente de leite, é uma atividade ingrata e injusta. Qualquer buteco de esquina ganha mais do que muitos produtores de leite, pois a renda no campo é assunto que não se comenta. Mas como sempre a esperança é a última que morre.

Parabéns pelas suas colocações e pelo seu trabalho.
Abraço.

<b>Resposta do autor:</b>

Prezado Márcio Teixeira

Agradeço os comentários.

Creio que a maioria dos produtores de leite brasileiros concorda temos dificuldade de ter efetiva assistência técnica, seja ela governamental ou privada, que temos dificuldade com financiamento adequado para custeio e investimento, que sofremos a pressão dos elos mais fortes da cadeia como a indústria e varejo que procuram manter suas margens quando as circunstâncias da economia e do poder aquisitivo do consumidor limitam o consumo e que esse quadro é ignorado pelo Governo.

Temos o direito de mudar essa situação, que é realmente injusta. Mas a questão é que quem tem direitos e não luta por seus direitos, não merece ter direitos e é ignorado por todos.

Realmente, à CNA, que pagamos, cabe liderar a luta e ter a força necessária para mudar essa situção. Mas chamo a atenção que para lutar e vencer não basta ter generais. É preciso ter exército motivado e que se mobize para a luta e para as conquista. E é exatamente isso que está faltando aos produtores de leite: mobilização. Espero que as lideranças da CNA, agora sob comando da senadora Katia Abreu, tenham a sensibilidade de que precisamos dos produtores mobilizados para que a CNA tenha a força necesária junto ao Governo e aos outros elos da cadeia produtiva para conseguir as mudanças que os produtores de leite precisam e merecem. Mas para mobilizar os produtores para a luta é preciso motiva-los e que eles de fato confiem nos seus lideres. E para isso é necessário trazer os produtores para participar das discussões e definição das propostas e depois coordenar a mobilização dos produtores. Como você muito bem disse, a esperança é a última que morre. Ainda tenho a esperança que a CNA consiga isso, pois tem o sistema necessário para abrangência nacional e forte atuação local, através das federações estaduais e dos sindicatos rurais.
LUCIANO PAIVA NOGUEIRA

SETE LAGOAS - MINAS GERAIS

EM 29/10/2008

Permitam-me a intervenção. Além de produtor sou advogado, e vejo com esperança este debate que se inicia. Tenho sempre dito que a conta é colocada no produtor, tratado como amador e não especializado. Esta seria sempre a razão da sua baixa ou inexistente renda.

Creio que este debate proposto pelo articulista é indispensável. Independente de ser o produtor profissional ou amador, estão pagando um preço justo pela mercadoria que ele vende?

Vejam bem, trabalho em uma grande empresa urbana e meus colegas de trabalho simplesmente não acreditaram quando disse que o leite caiu quarenta por cento para os produtores. Por que? Porque na gôndola do supermercado o preço não mudou um centavo!

Partindo para ações práticas, creio que a CNA ou outro órgão coletivo deveria conclamar o CADE a analisar as práticas de mercado adotadas pelos laticínios. Economicamente não há coerência em se alegar excesso de oferta e após reduzir o preço de aquisição do produto esta redução não ser repassada ao varejo, para estimular a demanda.

Há algo muito estranho nesta postura dos laticínios. Cabe ao Estado equilibrar o mercado quando um determinado grupo mais poderoso abusa do poder econômico para potencializar sua lucracitividade.

<b>Resposta do autor:</b>

Prezado Luciano Paiva Nogueira

Agradeço seus comentários.

Concordo que quando há abuso de poder econômico deve haver intervensão do Estado. Aliás, penso que deva haver intervenção do Estado até para evitar que haja abuso de poder econômico. Mas a questão é como caracterizar o abuso de poder econômico? Uma forma é se dispor de um mecanismo adequado para política e planejamento setorial, com atuação permanente, com representantes do setor público, dos produtores, da indústria e do varejo, onde se teria uma analise confiável e consistente de mercado ( hoje não há conbilidade nas informações de mercado ) que permitisse não só intervenção do Estado mas ajustes acertados entre os elos da cadeia para evitar as grandes oscilações de preços e a sustentabilidade econômica para todos os elos da cadeia produtiva.

Em 2001, quando enfrentávamos queda de preços em plena entresafra já percebia a necessidade de mecanismos mais efetivos para estabelecimento de política e planejamento mais adequados para o setor leiteiro, conforme você pode ver no artigo "Necessidade de uma Câmara Nacional de Arbitragem para o leite", publicado pelo Milkpoint em 21/12/2001. Propunha aí a criação de uma câmara setorial nacional para leite, contando inclusive com uma câmara de arbitragem.

Em 2002, junto com outras lideranças incluimos esse pleito na Carta da Expomilk encaminhada ao Ministro Pratini de Moraes, e partimos para a luta e acabamos conseguindo com o Ministro Roberto Rodriges implantar a Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Leite e Derivados junto ao Ministério da Agricultura, da qual fui convidado a participar. Já na reunião de instalação dessa câmara apresentei proposta para criação de grupo temático para políta e planejamento do setor leiteiro vinculado a essa câmara. Mas até hoje não conseguimos criar esse grupo que seria um grande avanço para a cadeia.

As dificuldades para conseguir implementar um mecanismo de política e planejamento para o setor leiteiro que traria beneficios para toda cadeia me levam a, como você, suspeitar que pode haver algo de estranho na postura, não só da indústria mas também comércio de laticínios. Mas estranho mais o Governo e muitas entidades que representam o produtor não perceberem a necessidade de implementar mecanismos mais efetivos para estabelecimento de política e planejamento setorial, extremamente necessário para evitar o abuso de poder econômico com relação ao elo que embora, seja a base da cadeia, é o mais fraco da cadeia, que é o dos produtores de leite.

Mas continuo lutando por essa idéia, como você pode ver no artigo "Romper com o passado e olhar para o futuro para fechar a conta", publicado por Milkpoint em 01/09/2008. Mas é preciso que muitos produtores tenham essa percepção e batalhem pela idéia para que ela possa ser implementada. Uma sugestão seria os produtores escreverem à CNA pedindo que ela assuma essa bandeira e lidere a implementação dessa idéia.
MARGOT RIEMANN COSTA E SILVA

NOVA CRIXÁS - GOIÁS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 27/10/2008

Os pequenos produtores, não somente de leite mas de qualquer produto rural, não têm condições de barganha dentro da cadeia produtiva que tem alto grau de concentração. Tenho pesquisado sobre a bacia leiteira de Piracanjuba/Goiás e percebo que a partir de 1990 os produtores fizeram seu "dever de casa", modernizaram razoavelmente sua produção e melhoraram muito sua gestão, mas as margens de retorno ainda são muito insatisfatórios. E os problemas se localizam "da porteira para fora".

O resultado é o envelhecimento do produtor (média de idade de 52 anos) e alta evasão dos jovens, além do aumento de processos produtivos predatórios na busca de escala, já que somente a escala permite uma melhor negociação.

Caminhamos para uma grave crise de abastecimento se esta situação não for revertida. Peço contatos no sentido do debate sobre medidas que possam ser tomadas no sentido da criação de salvaguardas para os produtores menores, garantindo sua permanencia no campo e a reversão da tendencia de processos produtivos predatórios.

Margot Riemann Costa e Silva

<b>Resposta do autor:</b>

Prezada Margot Riemann Costa e Silva

Agradeço seus comentários.

Não são apenas os pequenos produtores que não tem condições de barganha dentro da cadeia produtiva. São todos. A produção nacional deve estar na ordem de 68,5 milhões de litros por dia. Um produtor que tivesse uma produção de 68.500 litros por dia representa apenas 0,1% da produção nacional, e individualmente seria minima a sua condição de barganha no contexto da cadeia produtiva.

A condição de barganha dos produtores só será maior se estiverem unidos e engajados em associações fortes, cujo volume total de seus associados tenham um peso significativo no mercado, e portanto tenha força para agir "da porteira para fora". Mas isso ainda está longe da nossa realidade, pois a maioria de nossos produtores e dos nossos produtores ainda não se concientizaram que precisam desse trabalho "da porteira para fora" para que tenha maior poder de negociação de preços.

Com relação a margem de retorno, esta não depende só de preços, mas também de custo de produção, que para serem reduzidos dependem de organização, tecnologia e investimento, o que na nossa realidade atual também esta longe da maioria dos produtores. Uma associação de produtores forte poderia, além negociar melhores preços dentro da realidade do mercado, pode contribuir para trazer aos produtores a organização, tecnologia e investimentos que eles precisam para reduzir seus custos de produção e melhorar a margem de retorno.

Do jeito que as coisas estão, cada um por si, tanto para pequenos como para grandes é o salve-se quem puder, e muitos, grandes ou pequenos, deixarão a atividade, sobrevivendo os que conseguiram "salvaguardas".

No meu entender a melhor "salvaguarda" para os produtores, grandes ou pequenos, é participarem de associações fortes que efetivamente possam de um lado negociar melhores preços dentro da realidade do mercado e de outro trazer ao produtor a organização, tecologia e investimento para reduzir seus custos de produção. Mas para conseguir essa "salvaguarda" cada produtor precisa contribuir individualmente "da porteira para fora" para que suas associações cresçam e se fortaleçam para terem de fato condições de defender seus interesses, no campo político, na negociação de preços, e para trazer a organizaçõa, tecnologia e investimento necessários para reduzir seus custos.
MARIA LUCIA ANDRADE GARCIA

BELO HORIZONTE - MINAS GERAIS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 18/10/2008

Concordo em número e gênero com suas colocações sobre a necessidade de regulamentação que contenha a tendência à ilimitação dos mercados nessa era de globalização induzida pelas novas tecnologias de informação que permitem o acesso instantâneo a qualquer mercado do mundo. Recentemente a Folha de S. Paulo publicou um artigo de Calixto Salomão Filho com título sugestivo "Menos mercado", em que o autor diz o seguinte: "Na verdade, a ausência/disparidade de informação nos mercados revela um outro e mais grave problema. Existe uma enorme diferença entre o mercado como centro de trocas de uma pequena comunidade ou agrupamento humano (esse é o mercado na concepção original da teoria clássica) e o mercado entendido como lócus global e virtual de trocas e de organização do sistema econômico. Todas as presunções (informação completa, diluição de agentes) válidas para o primeiro são inexistentes no segundo. Mercado nessa última esfera serve apenas como substituto retórico para a organização das relações econômicas com base em puras relações de poder e de domínio de informação."

A pergunta que nós produtores deveriamos fazer seria: em que medida essa crise e o abandono da visão sacrossanta do mercado livre nos abre a oportunidade para novamente colocar o problema da formalização das relações entre produtor e indústria através de contratos com condições, exigências e salvaguardas explicitas? Seria uma maneira a limitar o poder da indústria de arbitrar e impor preços unilateralmente, ao mesmo tempo que as induziriam a planejar melhor e com mais cuidado suas necessidades de captação e de produção.

Outra sugestão que enviei à comissão Nacional de Leite da CNA, seria estudar a possibilidade do produtor de leite ter seus interesses protegidos pela nova legislação de Ação Civil Pública (1985) que visa proteger os chamados "interesses ou direitos difusos" que, diferentemente dos coletivos - que são determináveis e ligados a uma relação juridica base e anterior - vinculam-se a situações fáticas que atingem um indeterminado de pessoas, não requerendo vínculo jurídico específico. A lei de defesa do consumidor surgiu na esteira desse movimento jurídico de reconhecimento da existência nas sociedades modernas de direitos difusos e coletivos. De alguma forma o consumidor guarda analogia com produtor em sua dispersividade, desinformação e impotência (falta de poder) diante das empresas que vendem produtos e serviços ou compram leite.

Não sei, mas sinto que a hora é propicia para avançarmos um pouco na direção de algum tipo de formalização das relações produtor-indústria. A alternativa da integração aventada recentemente não me parece boa por tirar a iniciativa e a liberdade patrimonial do produtor, tranformando-o em funcionário sem carteira da indústria. Talvez possa se aplicar aos pequenos produtores, mas estes estão se reunindo em associações e cooperativas, com futuro a meu ver mais promissor em termos de preservação de sua liberdade e independência de produção.

<b>Resposta do autor:</b>

Prezada Maria Lúcia A. Garcia

Concordo que existe uma analogia entre o produtor rural e o consumidor no que tange a sua dispersividade, desinformação e impotência face a relações comerciais com empresas.

No entanto a existência do PROCON e da lei de defesa do consumidor caracterizando relações entre consumidoe/empresa me leva a crer que a situação é diferente e que foge da situação de direito difuso. Acho que seria ótimo se tivessemos uma lei de defesa do produtor rural e um "PROPROD".

Penso que ações civis públicas para proteger interesses ou direitos difusos dos produtores rurais, na prática, só podem se tornar realidade por iniciativa do Ministério Público, pois para o produtor rural individualmente essa iniciativa me parece inviavel, e talvez a própria CNA tenha dificuldade em entrar com ações dessa natureza.

Creio que o momento é oportuno e que nós, produtores rurais, devemos sugerir à CNA estudar a viabilidade de encaminhamento de projeto de lei para defesa dos produtores rurais no que se refere às relações comerciais com as empresas que compram nossos produtos, e que isso seria um grande avanço na formalização das relações produtor/indústria.

Com relação à integração produtor/indústria, nos moldes do que acontece com o frango, independentemente dos aspectos trabalhistas e patrimoniais (que tem que ser considerados), acho de dificil viabilização pelas próprias diferenças que existem entre as atividades da pecuária de leite e da avicultura.

Marcello de Moura Campos Filho
Presidente da Leite São Paulo

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