Notícias como a diminuição da oferta de animais no Rio Grande do Sul, aumento nos preços médios dos animais e na demanda por tourinhos de origem européia tem sido cada vez mais constantes. O que pode se observar neste cenário também, é que a grande valorização dos animais predomina nos de maiores aptidões leiteiras, como os com alto grau de sangue Holandês e Jersey. Quando analisamos a venda de animais de leite em leilões, um número impressionante é o de uma leiloeira, que até o mês de agosto já vendeu mais animais do que havia vendido em todo o ano de 2006.
Apesar do preço de venda dos animais ser um componente importante na composição da renda bruta da atividade leiteira, o fator de maior importância neste item é o preço do leite. O comportamento do preço médio do litro de leite pago ao produtor, corrigido pelo IGP-DI: julho de 2007, sofreu uma queda de 14,52%, de julho de 2005 para junho de 2006 no estado de Minas Gerais (MG). De julho de 2006 para junho de 2007 (06/07), houve um crescimento de 20,75% (CEPEA).
Ao analisarmos o comportamento dos indicadores técnicos e econômicos das propriedades participantes do Projeto Educampo, em Minas Gerais, durante os mesmos períodos citados acima, podemos perceber como foi o efeito das variações na renda bruta da atividade leiteira durante os últimos dois anos. De acordo com os dados do CEPEA, o preço médio do litro de leite, deflacionados (IGP-DI: julho/07), em 05/06 era de R$ 0,5125 e em 06/07, R$ 0,544, o que corresponde a um aumento de 6,14%.
De acordo com os dados da Central de Processamento de Dados do Educampo (CPDEducampo), os valores médios deflacionados para o mesmo período supracitado (05/06 e 06/07) foram de R$ 0,5403 e 0,5706, respectivamente, apresentando um aumento de 5,79% no preço pago pelo litro de leite ao produtor.
Mesmo com o aumento do preço do leite, é necessário analisar como foi o comportamento dos custos na atividade leiteira, para entendermos melhor se houve evolução na rentabilidade ou não. O Custo Operacional Efetivo da Atividade (COE) - custos que implicam em desembolso (concentrado, mão-de-obra, adubo...) - das propriedades participantes do Projeto Educampo - MG, também aumentou de um ano para o outro, em 5,60%.
Como a proximidade entre os acréscimos de custo e renda é grande, uma análise superficial poderia levar a uma conclusão precipitada de que a rentabilidade não evoluiu em nada. Entretanto, o estímulo no aumento de preço do leite e dos animais, implica numa melhoria da eficiência de produção nas empresas rurais do setor leiteiro, como pode ser visto na Tabela 1.
Além do aumento de preço, houve aumento na produção diária em 6,02% e, consequentemente, a produtividade por hectare também aumenta, neste caso, em 7,35%. Esse efeito sinérgico que aconteceu com o estímulo do preço fez com que a melhoria na margem bruta (Renda Bruta - COE) e líquida (Renda Bruta - COE - Depreciações - MDO familiar) da atividade, aumentasse em 27,51 e 60,58%. Comprovando o efeito positivo que preço e o volume têm na diluição dos custos, principalmente no que diz respeito aos custos fixos, que são contabilizados no Custo Operacional Total (COT = COE + custo da mão-de-obra familiar + depreciações).
As taxas de remuneração do capital com e sem terra também se comportaram da mesma forma que a margem líquida, pois houve um aumento de 3,12 e 1,46 pontos percentuais, respectivamente. O mais importante é que a utilização de mais insumos na pecuária de leite, nesses 2 anos, implicaram na melhoria da eficiência de utilização de dois fatores de grande impacto nos custos: mão-de-obra (indicadores 3 e 10) e terra (4, 13 e 17), conforme a tabela abaixo.
Tabela 1. Evolução dos indicadores técnicos e econômicos dos produtores participantes do Projeto Educampo, em Minas Gerais, em dois anos (Julho/05 a Junho/06 e Julho/06 a Junho/07). Valores corrigidos: IGP-DI Junho/07.
Fonte: CPDEducampo.
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Para conhecer melhor o que aconteceu dentro de algumas regiões, foram escolhidas duas em Minas Gerais e uma no Espírito Santo. As regiões são: Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, Sul/Sudoeste de Minas e Norte do Espírito Santo, onde existem vários grupos do Projeto Educampo (Tabela 2).
Os estímulos ao aumento da produção de leite foram bem diferentes nessas regiões analisadas, até porque o sistema de produção entre elas difere muito. No norte do Espírito Santo predomina uma pecuária mais extensiva, onde a participação da venda de bezerros é grande, devido ao grau de sangue dos animais explorados. No Triângulo e Alto Paranaíba, encontra-se um misto de animais Indicus e Taurus, portanto, é possível se deparar com sistemas altamente tecnificados (alto grau de suplementação e pastagens intensivas) e com sistemas menos tecnificados (pouquíssima suplementação volumosa e concentrada com utilização extensiva das pastagens).
Já no Sul e Sudoeste de Minas, sistemas de alta produtividade por vaca, suplementação volumosa e concentrada constante e alto capital empatado em benfeitorias e máquinas são os que predominam.
O primeiro fator que chama atenção é que a variação na produção diária foi maior nas regiões mais tecnificadas, mesmo que estas tenham tido um estímulo por parte dos preços menor. Pois no Sul e Sudoeste de Minas aumentaram a produção em quase 15% por um estímulo de apenas 5,10% no preço do leite, enquanto que no Norte do ES a produção diminuiu, mesmo com um aumento do preço em 10,20%. Este fato também pode ser explicado pela produtividade por vaca nessas duas regiões, que tiveram comportamentos antagônicos.
A produtividade por hectare (litros/ha/ano), mais uma vez explica bem o efeito que este indicador tem sobre a rentabilidade nos sistemas de produção de leite. A evolução neste indicador na 1ª região (sul/sudoeste) foi de 15,10%, na 2ª região (Triângulo/Alto Paranaíba) foi de 12,48% e na 3ª região (norte do ES) foi negativa em 4,45%. A conseqüência disso pode ser vista pela Margem Bruta por hectare da 1ª, 2ª e 3ª região, que tiveram 122,60, 35,85 e - 1,60% de incremento neste indicador. A margem bruta por hectare mostra que as duas regiões de Minas se tornaram mais competitivas em relação a outras culturas, após incorporar um pouco do aumento de preço do leite no cálculo do custo de produção.
Tabela 2. Evolução dos indicadores técnicos e econômicos dos produtores participantes do Projeto Educampo, em três regiões (Triângulo/Alto Paranaíba, Sul/Sudoeste de Minas e Norte do ES), nos dois últimos anos (Julho/05 a Junho/06 e Julho/06 a Junho/07). Valores corrigidos: IGP-DI Junho/07.
Fonte: CPDEducampo.
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Estranho é o comportamento que o norte do ES teve durante esse período porque, mesmo com um aumento no preço do leite de 10,20%, os indicadores de produtividade e rentabilidade diminuíram. Uma hipótese para esse desempenho negativo pode estar relacionado ao primeiro período, entre 2005 e 2006, pois o preço do leite foi baixo e um planejamento modesto para o próximo ano pode comprometer muito a capacidade de resposta aos estímulos de mercado. Outro fator, que parece ser o mais correto, está relacionado ao mercado dos animais de cria, recria e vacas (com menor produção de leite) para venda. Essas categorias devem ter passado por dificuldades de mercado durante este último ano, até porque este é um componente importante, pois representa mais de 30% da renda bruta da atividade neste tipo de sistema.
Seguindo essa linha de raciocínio, a Tabela 3 ajuda a esclarecer algumas questões. Houve crescimento de rebanho nas três regiões, mas a diferença está na estrutura do rebanho, que foi modificada. No Sul/Sudoeste de Minas o rebanho cresceu apenas 1,84%, mas a porcentagem de vacas, em relação ao número de animais do rebanho aumentou 4,72%, mostrando que os produtores não estão tão dispostos a vender muitos animais que estão gerando ou estão mais próximos de gerar renda (vacas em Lactação + Secas).
Na região do Triângulo/Alto Paranaíba, o rebanho cresceu 5,40% e a porcentagem de vacas no rebanho se manteve. Já no Norte do ES, o rebanho aumentou mais de 9%, mas o número de vacas, em relação ao rebanho, diminuiu 2,39%. Essa situação que aconteceu no Espírito Santo mostra que o crescimento do rebanho, além do aumento do número de vacas, houve um grande aumento do número de animais em cria e recria, que respondeu por mais de 70% do crescimento do rebanho como um todo.
Dois fatores podem estar associados a isso: menor investimento na categoria de fêmeas em recria (maior dificuldade para descartar) e menor demanda pelos machos em cria e recria na propriedade (refletindo a crise no setor de gado de corte). Qualquer um deles leva ao crescimento da porcentagem de animais "improdutivos" no rebanho, ao aumento dos custos e, consequentemente, diminuição das margens de lucro. No Norte do ES, a baixa procura ou o baixo valor dos machos no mercado regional podem ser os maiores causadores dessa situação.
Tabela 3. Evolução do número de animais das fazendas participantes do Projeto Educampo, em três regiões (Triângulo/Alto Paranaíba, Sul/Sudoeste de Minas e Norte do ES), nos dois últimos anos (Julho/05 a Junho/06 e Julho/06 a Junho/07). Valores corrigidos: IGP-DI Junho/07.
Fonte: CPDEducampo.
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As diferentes situações apresentadas são referentes apenas a três regiões da região Sudeste. A complexidade da pecuária leiteira e as peculiaridades de que existem de norte a sul e de leste a oeste são infinitas. O que precisa ser discutido e estudado são os fatores e cenários em que cada uma dessas regiões consegue se sobressair perante as demais culturas ao seu redor e as maneiras de otimização dos sistemas de produção utilizados na mesma região. É fato que não existe sistema melhor a ser recomendado, as três regiões demonstraram que é possível ter boas rentabilidades e que todas têm potencial para evoluir.
É preciso que as empresas rurais do setor leiteiro tenham maior controle sobre seus indicadores para melhorar a tomada de decisão e, consequentemente, minimizar os prejuízos nas épocas de "vacas magras" e maximizar o lucro quando estivermos na época de "vacas gordas". Para isso, só sabendo qual é o custo de produção da atividade leiteira e do leite.