O motivo pelo qual estou escrevendo este artigo seria apenas para tentar ajudar no esclarecimento de alguns fatos importantes em relação à produção de leite a pasto.
Primeiramente, antes de iniciarmos algum projeto, devemos analisar inúmeras variáveis para chegarmos à conclusão de qual sistema irá nos fornecer um melhor retorno. Variáveis como montante do capital disponível para o investimento, montante do capital necessário para iniciar a produção, conhecimento técnico do produtor, consultor e da mão de obra que será empregada, a raça/genética das vacas que serão utilizadas, clima do local, fertilidade e tipo do solo, topografia, atuais instalações da propriedade, produção por hectare a ser atingida, prazo para retorno do investimento, custos operacionais, etc.
Se, após realizar os estudos, o produtor acabar optando pela produção a pasto, outras diversas variáveis surgirão, como, que tipo de gramínea deve ser utilizada, qual será o sistema de parição, fornecer ou não alguma forma de volumoso e/ou concentrado durante determinada época do ano, taxa de ocupação, manter ou não as bezerras e novilhas na mesma propriedade, planejamento para aplicação de adubos e/ou fertilizantes, período para renovação do pasto, prazo de rotatividade, tamanho dos pastos, novamente o tipo de raça/genética a ser utilizada, instalar ou não algum tipo de irrigação, entre outros.
Referente ao tipo de gramínea que será utilizado, em minha opinião - que infelizmente não tenho muito conhecimento das variedades disponíveis no Brasil -, creio que seria uma boa opção a mistura de trevo branco com azevém em alguns pastos e outros com tifton-85. Mas enfim, o que devemos buscar, seria uma gramínea que forneça ao animal um bom índice de proteína e energia, apresente boa digestibilidade e palatabilidade, que seja resistente e apresente um bom crescimento durante o ano. Também é interessante analisar quantos quilos de alimento determinada gramínea produzirá em cada epóca do ano.
Em relação ao sistema de parição, creio que seria interessante ao produtor tentar programar as épocas de crias, e não apenas deixar o touro solto com as vacas ou inseminar o ano todo, pois essa prática acaba dificultando a elaboração de uma dieta balanceada, pois a vaca terá diferentes índices de ingestão para cada época de sua lactação. Por exemplo, seria interessante programar a época de parição do rebanho de tal modo que o pico de produção das vacas acontecesse junto com o pico de produção de maior qualidade da gramínea, resultando em uma melhor conversão entre alimento injerido e leite produzido, e consequentemente, o pico de ingestão da vaca ocorreria juntamente com o pico de produção da gramínea, período este que a mesma começará a perder qualidade.
Também é extremamente importante que o produtor saiba identificar quando a oferta da pastagem fica maior que a demandada por seus animais, pois a partir desse ponto, se o produtor apenas "largar", ele estará compromentendo tanto a produção do animal quanto a qualidade das gramíneas, pois as vacas estarão ingerindo um alimento de pior qualidade, resultando em redução na produtividade. As pastagens continuarão a perder qualidade (proteína e energia) e ainda diminuirão a digestibilidade e palatabilidade. Nessa época, o interessante seria colher o excesso e mantê-lo como silagem, pois assim o volumoso poderá ser fornecido aos animais quando a demanda por alimento for maior que a oferta disponível.
Se o produtor conseguir operar com eficiência o fato que citei acima e colher o excesso das pastagens, assim que a oferta das pastagens ficar menor que a demanda animal, devemos iniciar o fornecimento da silagem, podendo manter a produção em um maior nível por maior prazo, sem comprometer a condição corporal animal. Dependendo dos custos e do preço pago pelo leite, também poderia ser interessante ao produtor adquirir maiores quantidades de volumoso e/ou concentrado através de terceiros, podendo maximizar seu lucro. Porém, essa prática deve ser feita com cautela, pois dependendo do preço pago pelo alimento versus preço do leite, pode não ser compensatória.
Para sabermos qual seria a taxa de ocupação ideal, temos que levar em conta, também, diversos fatores. Tais como, clima, topografia, quantidade anual de matéria seca que o animal irá consumir e a quantidade anual de matéria seca disponível na propriedade, devendo incluir a quantia que as pastagens produzirão mais a quantidade de volumoso/concentrado extra. Também seria interessante levar em consideração se a propriedade possui ou não algum tipo de cocho ou instalação para proteger os animais em situações de climas extremos. A partir daí, poderíamos ter uma melhor avaliação e determinar uma taxa de ocupação mais precisa para ser utilizado na propriedade.
Dependendo do custo e/ou disponibilidade de terras para arrendamento ou terceirização da mão de obra na região, acaba compensando ao produtor transportar suas bezerras, depois do desaleitamento, para outro lugar, e mantê-las por lá até uma ou duas semanas antes das mesmas começarem a parir. O que devemos analisar, seria, qual o custo que o produtor terá para arrendar as terras ou para terceirizar o serviço e qual lucro o mesmo irá obter aumentando o número de vacas em lactação na propriedade, pois assim toda a propriedade poderá ser utilizada apenas para animais em lactação.
É necessário que o produtor faça, ao menos uma vez por ano, a análise de solo. Pois assim será possível determinar a quantidade de adubo e/ou fertilizante necessário para manter o solo com uma boa qualidade. Uma boa prática seria a captação de todo efluente gerado durante a ordenha e aplicá-lo em determinadas áreas da propriedade. Porém, essa aplicação deverá ser feita com conhecimento e cautela, para evitar qualquer dano a saúde animal e ao meio ambiente.
Fazendas que utilizam alguma forma de cocho ou "free stall" possuem uma alta disponibilidade de efluente gerado nessas instalações, que também servirão para aplicação nas pastagens. Se utilizado de maneira correta, todo o efluente gerado durante o ano poderá salvar ao produtor dezenas de milhares de reais na aplicação de adubos/fertilizantes, dependendo do tamanho da propriedade e do número de animais.
A renovação do pasto deve sempre ser feita, pois ao decorrer do tempo a pastagem perde qualidade e não apresenta o mesmo retorno que teve anteriormente. Também é importante durante a utilização da mesma, efetuar o controle de pragas e plantas daninhas. Dependendo da região e do tipo de pastagem, uma renovação a cada 6 ou 8 anos seria ideal.
Diversas técnicas de renovação podem ser utilizadas. Uma boa opção, em minha opinião, seria entre a renovação cultivar algum outro tipo de forrageira, como, cana, milho, cevada, couve, entre outros. Pois assim, poderíamos trabalhar o solo, utilizar o produto plantado e colhido como suplemento e depois plantar novamente algum tipo de gramínea.
A rotavidade dos pastos depende do clima, região e da época do ano. Por exemplo, quando temos abundância de pastagem, a taxa de rotatividade deve ser acelarada e quando a pastagem começar a crescer mais devagar, devemos desacelerar a rotatividade. Por isso acredito na importância em utilizar uma época programada para parição. A utilização de cercas elétricas, tanto fixas quanto temporárias é ideal nesse sistema de produção. Seria interessante calcular quanto o rebanho necessita de alimento e tentar fornecer apenas aquela determinada quantia depois das ordenhas, assim o desperdício será reduzido consideravelmente.
Tambem é muito importante saber quanto que o produtor tem em matéria seca por hectare, tanto antes quanto depois das vacas passarem pelo pasto. Em épocas de abundância, dependendo do tipo da pastagem, seria interessante colocar as vacas no pasto quando a oferta da grama atingisse cerca de 3300 quilos de matéria seca/ha, e calcular de tal modo, que os animais deixem um resíduo em cerca de 1500 quilos de matéria seca/ha. Por exemplo, se temos um pasto de 03 hectares com 3200 kgMS/ha, e desejamos atingir um resíduo de 1500 kgMS/ha, podemos chegar a conclusão que essa determinada área possui 1700 kgMS/ha de pastagem, portanto, há disponível 5.100 kgMS. Se possuímos um rebanho com 100 vacas, a oferta seria de 51k gMS/vaca, ou seja, bem mais do que o animal precisa durante meio dia.
Note que seria crucial a utilização de uma cerca elétrica temporária para que seja fornecido apenas aquilo que o animal precisa. Portanto, nesse pasto, o produtor poderia se beneficiar por cerca de cinco intervalos, fornencendo em torno de 10,2kg de matéria seca por animal por intervalo. O tamanho dos pastos pode ser definido através de um estudo em relação a área da propriedade que será destinada à atividade leiteira, o número de animais e a utilização frequente ou não de cercas elétricas temporárias.
A respeito do tipo de raça/genética que o produtor deverá investir, devemos analisar se o mesmo pretende ou não fornecer suplementos ao animais. Se a produção for exclusivamente a pasto, fornecendo suplementos em algumas épocas do ano, é obvio que não compensa ao produtor investir muito em vacas holandesas de alta produção, pois essas não produziriam a mesma quantidade que estariam produzindo em um sistema confinado.
Em minha opinião, uma boa escolha seria tanto Jersolando, quanto Girolando, pois são animais que apresentam uma maior resistência que o gado puro holandês e possuem um índice de produção menor por animal. Não tenho experiência com Girolando, mas no caso da Jersolando, um outro benefício seria que o animal produzirá um leite com maior quantidade de sólidos (ideal para um planejamento de médio prazo) e necessita uma menor quantidade de alimento (se compararmos com uma holandesa pura). Enfim, o ideal seria investir em animais que produzam cerca de 15 a 25 litros/dia. Também é preciso levar em consideração fatores climáticos e topográficos.
Dependendo da região a utilização de irrigação seria de tal modo, crucial, pois nas épocas de seca, além da produção a pasto diminuir drasticamente, o preço por litro de leite pago ao produtor geralmente aumenta. Nesse caso, o produtor não precisaria se preocupar com a redução na produção e ainda conseguiria se beneficiar de um pagamento extra pelo leite vendido.
Uma boa opção para grandes propriedades, seria a utilização dos pivôs. Porém, essa prática necessita de uma grande produção para justificar tal investimento e manuntenção necessários para operação do mesmo. Entretanto, os menores produtores, podem se beneficiar de sistemas como de asperção ou inundação, pois apresentam custos bem menores, tanto para instalação quanto para manutenção. Outro tipo de irrigação com baixo custo, poderia ser feita por um irrigador, porém, não sei se há disponibilidade no Brasil.
Se o produtor possui capital disponível, seria interessante também a criação de um tanque para armazenamento de água e a instalação de um sistema de drenagem em determinados locais no pasto, pois assim ele poderia se beneficiar em não ter pastos inundados nas épocas de chuva e ainda amazenar a água para irrigar a propriedade no período da seca.
Como disse anteriormente, as variáveis são imensas, e cada caso é um caso, mesmo que seja no mesmo sistema de produção. Por isso, é necessário que tanto o produtor quanto o consultor tenha um bom conhecimento técnico, estude diversas possibilidades, busque novas informações, visite propriedades que tenham o sistema similar ao que o mesmo deseja implantar, faça um bom projeto, acompanhe de perto tudo o que está acontecendo com a propriedade e opere com um bom gerenciamento, independentemente do sistema que será introduzido. Pois assim, com certeza, o sistema será rentável e sustentável.
Peço desculpas por não conhecer exatamente a disponibilidade de produtos, solos e sistemas no Brasil, mas mesmo assim espero ter ajudado ao menos algumas pessoas.
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