A região Norte conta com uma área próxima de 3,85 milhões de km², ou 45% da área total do Brasil. Sua produção de leite, segundo dados do IBGE-2012, é de 1,6 bilhão de litros, equivalente à produção do Estado de São Paulo.
No período de 1990 a 2001, a produção leiteira na região Norte do Brasil foi a que apresentou o maior índice de crescimento em todo país, registrando aumento de 122,7% na produtividade (BRESSAN & VILELA, 2003), incremento obtido graças à expansão horizontal do rebanho da região. Apenas Rondônia está entre os dez maiores Estados produtores. O Pará ocupa o 11°, o Tocantins 18°, e os demais têm pouca expressão na atividade, colocados nos últimos lugares do ranking nacional.
Já nos últimos 5 anos, a produção permaneceu praticamente estável. Rondônia, Pará e Acre decresceram 1%, 6% e 39%, respectivamente, enquanto Tocantins, Amazonas, Amapá e Roraima cresceram 21%, 18%, 109% e 72%, nessa ordem, como mostra atabela abaixo.
Tabela 01 – Evolução da produção de leite na região Norte
Em Rondônia, os principais municípios produtores são: Ouro Preto d’Oeste, Ji-Paraná, Cacoal, Presidente Médici e Jaru. Nos municípios Nova Mamoré e Buritis, da microregião de Porto Velho, nota-se bom crescimento da produção. Nova Mamoré, por sinal, já é o 4° município maior produtor de leite no Estado.
No Pará, a produção se concentra nos municípios de Água Azul do Norte, Xinguara, Piçarras, São Félix do Xingu, Novo Repartimento e Rio Maria. No Tocantins, a produção leiteira se concentra principalmente nos municípios de Araguaçu, Porto Nacional, Arraias, Goianorte, Formoso do Araguaia e Araguaína.
Com essa dimensão territorial da região e um mercado consumidor reduzido, em razão de uma baixa densidade populacional, não é difícil imaginar que os grandes desafios da produção de leite do Norte do país estão na logística de abastecimento e de distribuição.
Nos últimos cinco anos a produção regional se manteve praticamente estável. Rondônia, Pará e Acre, decresceram o volume em 1%, 6% e 39%, respectivamente, e Amazonas, Tocantins, Roraima e Amapá, cresceram respectivamente 18%, 21%, 72% e 109%.
Tabela 02 – Ranking da Produção dos Estados da Região NorteFonte: IBGE
A região tem uma característica edafo-climática própria e diferente do restante do país. O clima que prevalece ao longo da região é o equatorial úmido, caracterizado por elevadas temperaturas e grande quantidade de chuvas durante todo o ano. Essa condição não é adequada à saúde e ao bem-estar dos bovinos, especialmente os de raças européias. Já a espécie bubalina tem uma adaptação muito boa a essas condições, razão pela qual a grande população de búfalos do país habita a região norte.
Apenas nos cerrados de Tocantins, Sul do Pará e Sul de Rondônia (Vilhena, Chupinguaia), chove menos e com períodos de estiagem mais prolongados. Algo a se destacar: no chamado Cone Sul de Rondônia e Roraima, a cultura da soja está ocupando lugar de crescente importância na economia regional.
A vegetação predominante é a mata. Nela se encontra inserida a Floresta Amazônica brasileira.
Particularidade também a ser assinalada: o Código Florestal Brasileiro permite o desmatamento de apenas 20% das áreas a serem exploradas na região, com preservação obrigatória de 80%, o que limita fortemente a expansão do Agronegócio na maior região do país.
O pasto é o alimento principal para os rebanhos durante todo o ano. A Brachiaria brizantha é o capim que prevalece. Outras gramíneas tropicais como as do gênero Panicum (Tanzânia, Mombaça...) também se desenvolvem com muito vigor quando cultivadas. Tive oportunidade de visitar no Pará muitas fazendas que, com o apoio da unidade da Embrapa de Belém, introduziram estas gramíneas com muito sucesso.
A região Norte apresenta boas condições para a produção de forragens tropicais. No entanto, há necessidade de maior tecnificação do produtor, tanto na formação, quanto no manejo das pastagens. Ponto favorável à pecuária, tanto para a de leite quanto para a de carne, é o relativo baixo custo da terra. No entanto, a condição de clima quente e úmido, ao mesmo tempo que é boa para a produção de pasto tropical, favorece a ocorrência de pragas e doenças nas pastagens, particularmente de cigarrinhas e fungos.
Os suplementos volumosos em períodos de estiagem ainda são muito pouco presentes nos projetos de produção de leite. Quando encontrados, somam pequenas quantidades de capim elefante e a cana-de-açúcar. A silagem, a não ser no Tocantins, quase não existe. Os concentrados são igualmente pouco utilizados na suplementação dos animais.
O rebanho bovino predominante é azebuado (girolando e outros), ainda com muitas vacas “brancas” nos rebanhos.
A inseminação artificial é muito pouco praticada. A ordenha é, na maioria das vezes, manual com apenas uma ordenha ao dia, realizada pela manhã. As vacas e os bezerros, em muitas propriedades, só são apartados à tarde. Esta prática contraria a boa técnica no tocante ao manejo reprodutivo, por criar condições para que a vaca retarde o seu cio. Prejudica também tanto a vaca quanto o bezerro, pois ocorrem várias mamadas durante o período. Ordenhando os animais apenas uma vez ao dia resulta em perda de pelo menos 25% da produção, com o mesmo númerode vacas. A prática de duas ordenhas diárias permitiria, ainda, a obtenção de um leite com maior teor de gordura.
Característica bem marcada da produção de leite no Norte do país também a pouca presença da ordenha mecanizada.
Por outro lado, as condições climáticas favoráveis ao pasto tropical igualmente favorecem a ocorrência de endo e ectoparasitos que acometem o rebanho. Uma atenção especial deve ser dada ao manejo sanitário dos animais.
O parque industrial da região Norte está principalmente preparado para a produção de queijos, que deve consumir cerca de 80% da produção. Em Rondônia, que conta com cerca de 60 laticínios, com fiscalização federal, estadual e municipal, operam três fábricas de pó e três de UHT. Em Tocantins também encontramos uma unidade apta para a secagem de pó, mas nenhuma de UHT. No Pará, o Laticínio Lana, que já opera com uma das duas fábricas de UHT existentes, está construindo a primeira planta de leite em pó do Estado. Nos demais, não existem plantas de leite longa vida e de pó.
A implantação da coleta a granel foi fundamentada na introdução de tanques comunitários, em praticamente toda a região. Eles prevalecem com todas as dificuldades que o modelo oferece. Faz-se necessário um melhor trabalho com o objetivo de, ao menos, reduzí-los com a colocação de maior número de tanques de menor tamanho, com consequente redução de usuários por tanque.
São muitos os casos de tanques coletivos de maior capacidade, para os quais convergem muitas linhas de leite quente, com o produto recolhido em latões. O dono do tanque, via de regra, é também o encarregado do transporte, que recolhe o leite quente. Como as distâncias são grandes, o produto fica muito tempo esperando pela coleta, e, muitas vezes, exposto ao sol, interfere negativamente na sua qualidade.
Esse conjunto de fatores – os de logística deficiente e inadequação da produção, ordenha e coleta do leite – impede que a produção chegue às unidades de resfriamento e/ou processamento com uma contagem bacteriana (CBT) adequada. A contagem celular somática (CCS) é muito baixa, em razão da genética dos animais com pouca produção de leite. Os sólidos estão abaixo da média nacional, o que provavelmente se explica por dois fatores: primeiro, pelo interesse do produtor em criar bem o bezerro, ao qual os criadores reservam o resíduo de leite de todos os tetos da vaca, exatamente a porção mais gorda do resultado da ordenha; em segundo lugar, pela prática de apenas uma ordenha diária, já que pesquisas indicam haver aumento no teor de gordura à medida que se eleva a frequência de ordenhas.
Em razão da baixa densidade demográfica, o leite e seus derivados precisam viajar muito para chegar ao mercado consumidor, o que eleva os custos logísticos. Pelo fato de a produção ser pequena e ainda muito dispersa, o consumo per capita de leite em pó na região é o mais elevado do país. No geral, é a região de menor consumo de leite e derivados do país, o que, por outro lado, representa vantagem competitiva para o produtor e a indústria de leite da região Norte.
O desafio para se obter um leite com qualidade na região é bastante grande. As instalações ainda são inadequadas. Os locais de ordenha muitas vezes não são calçados e faltam até mesmo abrigos para a ordenha nos dias de chuva. A mão-de-obra é ainda muito pouco preparada. As distâncias das fazendas até a chegada do leite às fábricas são grandes. Há muitos problemas com as estradas e muitas propriedades ainda não dispõem de energia elétrica. O setor público tem um grande “dever de casa”, que é melhorar a infraestrutura das principais regiões produtoras, capaz de proporcionar melhores condições para o produtor e a indústria.
O serviço público de assistência técnica está representado em toda a região. Como nos demais Estados da federação faltam, porém, recursos, embora se constate a presença de muitos técnicos comprometidos e dedicados dentro destes órgãos. Em Porto Velho e Belém, localizam-se duas unidades da Embrapa, Agro Florestal e Amazônia Oriental, respectivamente, que se têm dedicado a trabalhos em benefício da produção leiteira nos Estados-sede (Rondônia e Pará) e mesmo nos Estados vizinhos. A Universidade também tem papel importante na divulgação de tecnologias de produção técnica e gerencial aos diversos segmentos da cadeia. É o caso da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), que tem sua unidade principal em Belém e tem formado pessoal com bom conhecimento na atividade leiteira. O Senar e o Sebrae também desenvolvem ações de interesse para o desenvolvimento do setor leiteiro. Algumas empresas privadas promovem, através de seus técnicos, algum tipo de suporte ao produtor, principalmente voltados para a melhoria da qualidade. O programa Balde Cheio, da Embrapa Sudeste, atua na assistência técnica e gerencial de grupos de produtores em alguns Estados do Norte.
Faz-se necessária uma ação conjugada das empresas e instituições focadas no desenvolvimento dos produtores. As indústrias precisam trabalhar com muito critério a coleta e a qualidade do leite. O setor se ressente da falta de melhor infraestrutura, responsabilidade intransferível do poder público, que impõe obstáculos à viabilização dos necessários ganhos logísticos e de qualidade. Falta também uma maior representatividade regional ao setor, cuja ausência dificulta a obtenção de fortalecimento da cadeia produtiva e melhorias estratégicas.
Em resumo, são muitas as oportunidades que se abrem ao setor leiteiro na região Norte, mas, em igual proporção, são grandes os desafios a serem enfrentados.