Eng. Agrônomo, Doutor em Zootecnia
Professor do IFCE – Campus Limoeiro do Norte, Ceará
Vários problemas estão batendo à porta das fazendas produtoras de leite do estado do Ceará. Estamos vivenciando cinco anos com precipitações reduzidas. O último ano em que houve recarga dos reservatórios de forma significativa foi em 2009. De 2010 até hoje tivemos somente o 2011 com precipitações significativas, que se não fosse este, só Deus sabe como estaríamos. Nos demais anos sempre precipitações reduzidas, com 2012 chegando ao limite inferior para o desenvolvimento das culturas, inclusive as pastagens naturais.
Há muito se sabe da relação entre condições climáticas, tipo de solo e respostas das culturas, sendo o entendimento destas relações a base para a produção animal. E é por compreender estas relações que se afirma a menor vulnerabilidade da produção animal nas condições de risco intrínsecas ao ambiente semiárido brasileiro. Tal condição de menor vulnerabilidade tem como grande fundamentação a possibilidade do equilíbrio da oferta de alimento para os rebanhos via armazenamento, realizado nos anos de maior produção. Mas para que seja possível o equilíbrio entre demanda e oferta apresenta-se de forma fundamental o planejamento forrageiro da propriedade ou a aplicação da técnica da orçamentação forrageira com caráter de longo prazo.
Contrariamente e especificamente nas condições de semiárido cearense, tem sido observada a manutenção do crescimento da produção de leite ao longo destes anos de seca. Esta condição apresenta-se como resultados de várias melhorias realizadas na oferta de água pelo Estado, com maior intensidade nos últimos 10 anos, tendo em sua base o uso da irrigação. Lembramos que a irrigação é um exemplo de armazenamento indireto de comida, no caso, via o armazenamento de água.
Não entender o caráter de variação dos fluxos de água e comida na condição de semiárido predispõe os sistemas a momentos de colapso, como o previsto para o ano de 2015. Há previsibilidade de falhas na oferta de água e alimentos volumosos nos sistemas locais. Todavia, como dito, há previsibilidade, e havendo esta condição saímos da situação de incerteza e chegamos à condição de risco, que tecnicamente possibilita a gestão dos sistemas com menor possibilidade de falhas. Como exemplo há o fato da oferta de água via os barramentos (açudes) terem normalmente garantia por volta de 90%. Isto quer dizer que a cada 10 anos têm-se garantia de que haverá água disponível em nove com falha possível em um ano. Assim, devemos ter alternativas para esta possível falha.
Concomitante a evolução dos sistemas via irrigação tivemos o incremento do potencial produtivo dos rebanhos, graças ao uso significativo de inseminação e aquisição de matrizes de maior potencial produtivo comprovado. Soma-se a isto o incremento no tamanho do rebanho e condições climáticas mais regulares entre os anos de 2000 e 2010. Desta combinação não é difícil encontrar produtores que outrora produziam 30 a 50 litros ao dia e hoje produzem 300 a 500 litros. Não vamos nem falar dos produtores que hoje produzem volumosos superiores a 10.000 litros ao dia.
Até agora vivenciamos um clima de euforia, similar ao observado nos dias inicias de uma paixão. Neste estado, de apaixonado, costumamos ir pelo coração e esquecemo-nos da razão, resultando vez por outro em lágrimas.
Se não bastasse o mencionado anteriormente sobre a ausência do planejamento da oferta de alimentos volumosos para o rebanho, crescimento da produção muitas vezes apaixonado e período de limitações climáticas, via menores precipitações observadas ao longo dos últimos cinco anos, temos agora o fantasmas do apagão de compradores. Sem dúvida, caso venha a se concretizar a falha do sistema por falta de compradores, haverá o aparecimento de um novo fator limitante capaz de criar mais instabilidade no setor.
Assim, ficamos a nos perguntar: será que virão todos ao mesmo tempo? Se vierem, qual será o impacto econômico e social para a região? E o que poderemos fazer, visto o pequeno tempo de reação disponível?