Aproveitando a discussão iniciada no último artigo sobre a qualidade das diferentes variedades de cana-de-açúcar na nutrição de ruminantes, serão apresentados aqui os resultados de um estudo realizado no Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa-MG, onde a cana foi utilizada como volumoso exclusivo para vacas em lactação puras e mestiças, da raça holandesa, em comparação a um tratamento com silagem de milho.
Foram utilizadas 12 vacas, em confinamento total, alojadas em baias individuais e distribuídas em três tratamentos (quadrado latino 4x4), de acordo com o período de lactação. O experimento constituiu de 4 períodos de 19 dias cada. O leite foi coletado no 12o dia de cada período.
Quatro dietas foram avaliadas: um tratamento com silagem de milho (T1), utilizado como termo de comparação e outros três tratamentos com cana-de-açúcar como volumoso. As dietas com cana diferenciaram-se pela suplementação. Um tratamento adicionou 0,35% de uréia e sulfato de amônia (na proporção 9:1), na matéria original (T2), para assemelhar o teor de proteína da silagem de milho. Nos outros dois tratamentos (T3 e T4) a cana foi tratada com 1% da mesma mistura uréia + sulf. de amônia. Nos tratamentos 1, 2 e 3 a relação volumoso:concentrado foi de 60:40 (na matéria seca) e no último tratamento (T4) esta proporção foi mais estreita, 50:50.
As dietas eram isoprotéicas, com 15,5% de proteína bruta e foram formuladas para atender os requerimentos nutricionais de vacas com 550 kg de peso vivo e produção média de 20 kg de leite com 4% de gordura, conforme o NRC (1988). Para este balanceamento foram utilizados fubá de milho, farelo de soja, farelo de algodão, uréia e minerais.
Os resultados de produção podem ser observados na tabela 1. A produção de leite foi superior (p<0,05) para o tratamento com silagem de milho e não houve diferença entre os tratamentos com cana-de-açúcar. Não houve diferenças (P>0,05) nas produções de leite corrigidas para 3,5% de gordura entre as dietas com cana. A análise estatística também não apontou diferença nos valores de produção corrigida entre os tratamentos com silagem de milho e cana + 1% de uréia (e 50% de volumoso - T4).
Tabela 1: Resultados produtivos
1- T1= Sil. de milho (40%de concentrado); T2= Cana + 0,35% uréia (50% de concentrado);
T3= Cana +1% Uréia (40% concentrado); T4= Cana + 1% de uréia (50% de concentrado)
Médias seguidas de letras diferentes na mesma linha diferem estatísticamente - Tukey a 5%
Segundo os autores, outras pesquisas já demonstraram desempenho inferior em vacas alimentadas com cana-de-açúcar quando em substituição à silagem de milho. Eles argumentam que esta menor produção pode ser explicada, pelo menos em parte, pela menor ingestão de matéria seca dos animais consumindo cana, função da menor degradabilidade de sua fibra, o que já foi mencionado no artigo anterior nesta mesma seção, que tratava da qualidade das diferentes variedades de cana.
A composição do leite não apresentou diferenças significativas, como pode ser constatado nos dados.
Os autores avaliaram ainda os valores de pH e nitrogênio amoniacal (N-NH3) ruminal antes e três horas após a refeição matinal. Não houve diferenças significativas (P<0,05) entre os tratamentos, com exceção para o N-NH3 antes da refeição matinal. Os valores podem ser observados na tabela 2.
Tabela 2: pH e Nitrogênio amoniacal ruminais
1- T1= Sil. de milho (40%de concentrado); T2= Cana + 0,35% uréia (50% de concentrado);
T3= Cana +1% Uréia (40% concentrado); T4= Cana + 1% de uréia (50% de concentrado)
Médias seguidas de letras diferentes na mesma linha diferem estatísticamente - Tukey a 5%
Os autores concluíram que a silagem de milho, sob o ponto de vista da produção animal, para animais com produções médias diárias de 20 kg/dia, mostrou-se superior à cana-de-açúcar, independente da forma de utilização.
Comentário MilkPoint: estes dados mostram que a simples correção do teor protéico da cana com uréia não é suficiente para igualar seu valor nutritivo à silagem de milho. Isto certamente está ligado a fatores como a qualidade da fibra. Neste experimento a cana exigiu maior suplementação na forma de concentrados para assemelhar seus resultados à silagem de milho. Isto deve ser considerado quando se faz a escolha da forragem a ser utilizada num determinado tipo de exploração. Dependendo do nível de produção dos animais a suplementação da cana deve ser intensa o que acaba encarecendo substancialmente a dieta (de modo geral quando as produções superam os 20 litros de leite).
Fonte: Mendonça, S. de S. et al., 2001. Cana-de-açúcar como volumoso único para vacas de leite. 1. Produção e composição do leite e 2. Parâmetros ruminais: pH e amônia. In: Anais da 38a Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Zootecnia. Piracicaba - SP.