Henrique Zaparoli Marques
Paulo Fernando Machado
Clínica do Leite
Medidas preventivas da mastite já estão claramente estabelecidas na literatura (10 pontos do NMC – National Mastitis Council), e os programas de controle hoje existentes seguem tais recomendações. No entanto, a taxa de insucesso destes programas é elevada. Para entender as causas desta ineficiência, diversos estudos foram conduzidos. Um deles, realizado na Holanda, mostrou que uma das causas do insucesso estava justamente no homem. Foi observado neste trabalho que 47% da variação da CCS do tanque era devido ao fator humano (Jansen et al., 2009).
Considerando a realidade brasileira, que difere dos países desenvolvidos visto que muitos proprietários não residem nas fazendas, um trabalho foi conduzido pela Clínica do Leite, em 2014, para estudar quais as características de rebanhos com baixa e alta CCS (Esguerra, 2014). Para tanto, 78 fazendas fornecedoras de uma mesma indústria foram divididas em dois grupos: baixa CCS (menos que 250.000 células/ml) e alta CCS (mais que 700.00 células/ml). Os resultados do trabalho mostraram que o tamanho da propriedade, a produção média por animal, o número e escolaridade dos empregados, o tempo de casa dos empregados, a genética dos animais, o tipo do equipamento de ordenha e o sistema de produção não eram significativamente diferentes entre os dois grupos. O que os diferenciava era se o proprietário tinha orgulho do negócio, se o leite representava a maior porcentagem de sua renda total, se o produtor percebia-se capaz de resolver os problemas relacionados a mastite, se as perdas devido a mastite eram claras para ele e se esta se relacionava bem com seus empregados. Chamamos estas características de mentalidade gerencial.
Diferentemente do que se pode imaginar, esta realidade não é exclusiva da área agropecuária – ocorre em outros negócios também. Uma pesquisa conduzida por uma empresa de consultoria dos Estados Unidos (KRW International), investigando 84 empresas, mostrou que aquelas em que o responsável apresentava mentalidade gerencial obtinha-se maior retorno sobre o capital investido, consequentemente, a taxa de sucesso era maior (Kiel, 2015). A pesquisa demostrou que os líderes das empresas de sucesso apresentavam quatro características com maior frequência do que naqueles líderes das outras empresas – integridade, responsabilidade, tolerância e compaixão.
Em outro trabalho conduzido pelos pesquisadores da Clínica do Leite, em 2015, 88 propriedades localizadas no Estado do Paraná foram visitadas e aplicados questionários tanto para o proprietário (com o intuito de levantar seu perfil) como para os funcionários. O objetivo de tal pesquisa era detectar se as visões dos proprietários e dos funcionários estavam alinhadas. Para tanto, o atendimento das necessidades de Maslow dos funcionários foi mensurada tanto pelos próprios funcionários quanto pelos proprietários. O atendimento das necessidades de Maslow está diretamente relacionada com o engajamento dos funcionários, sendo estas divididas em 5 necessidades:
Auto-estima: sentir-se valorizado, ser tratado com respeito, ser apreciado, encorajado, ter o trabalho reconhecido;
Sociais: fazer parte do grupo, ter relacionamentos saudáveis entre funcionários e com superiores;
Segurança e Proteção: sentir que a empresa é forte, saber para onde o negócio está indo, ter normas de conduta;
Básicas: ter salário de mercado, ter boas condições de trabalho, ter uma residência, dispor de educação para os filhos, ter assistência médica.
Abraham H. Maslow desenvolveu em 1954 a teoria de motivação de Maslow (Maslow, 1987) com o intuito de entender a motivação do homem em organizações. De acordo com Maslow, as necessidades humanas estão arranjadas segundo uma hierarquia. A teoria diz que uma necessidade é substituída por outra (a seguinte a mais forte na hierarquia) à medida em que esta começa a ser satisfeita. Dessa forma, em ordem decrescente, as necessidades são: fisiológicas ou básicas, segurança e proteção, sociais, auto-estima e auto-realização.
Os índices de atendimento das necessidades dos funcionários pesquisados, tanto na visão dos mesmos, quanto na dos seus empregadores, são apresentados na figura 1. Considerou-se que, quando a necessidade apresentava, no mínimo, o valor de 3,6 (80% do total) poderia-se dizer que estava sendo atendida. Com este critério, no caso deste estudo, apenas as necessidades básicas e sociais dos funcionários estavam sendo atendidas.
Figura 1. Índice de atendimento das necessidades de Maslow dos funcionários.
A pesquisa mostrou que o ranqueamento dos fatores pelos funcionários não seguia a mesma ordem listada pelos empregadores. Isto indicava que os proprietários não se comunicavam com a frequência necessária com seus subordinados e, por isso, não entendiam suas necessidades na íntegra. Outra observação importante é a de que os empregados tinham na segurança no emprego o ítem que consideravam mais importante para sua motivação. Isto pode acontecer pelos sinais que recebem dos produtores que, muitas vezes, mencionam que a atividade leiteira não é um bom negócio, ou que não tem herdeiros para sua continuidade, fazendo com que os empregados se sintam inseguros quanto ao seu futuro. Outro ponto é que eles gostariam de ser mais reconhecidos pelo que fazem. Observa-se que, em alguns lugares, os produtores tem receio de elogiarem seus funcionários porque acreditam que, em o fazendo, vão gerar demandas que eventualmente não poderão atender. Por fim, em terceiro lugar, apontaram as boas condições no trabalho como outro ítem importante.
Em conclusão, o homem é um importante fator de risco da mastite, mas além disso é o principal fator para atingir ou não o sucesso em qualquer tipo de negócio. Para tanto, o produtor de leite deve ser um líder e deve procurar engajar ao máximo seus funcionários.
Referências bibliográficas
ESGUERRA, Juan Camilo. O homem como fator de risco da mastite. 2014. 56 p. Dissertação (Mestre em Ciências) – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba. 2014.
JANSEN, J et al. Explaining mastitis incidence in Dutch dairy farming: the influence of farmers’ attitudes and behavior. Preventive Veterinary Medicine, vol. 92, p 210-223, 2009.
KIEL, Fred. Return on character: the real reason leaders and their companies win. Harvard Business Review, 2015.
MASLOW, A. H. A theory of human motivation. In: MASLOW, A. H. Motivation and personality. 3ed. Nova York: Harper & Row Publishers Inc., 1987. Cap. 2, p. 15-31.
Observação: Artigo publicado no VI Congresso Brasileiro de Qualidade do Leite (2015)