Vamos analisar os dados históricos da CCS do tanque de uma fazenda:
Figura 1 - Dados históricos da CCS do tanque
Essa fazenda fornece leite para uma indústria que tem um programa de pagamento pela qualidade onde, para que o produtor receba o melhor preço possível, a CCS deve ser menor que 400 mil céls./mL. Como podemos observar essa fazenda nem sempre atinge a meta especificada por seu cliente, no caso o laticínio, portanto está com um problema.
Diagnosticando problemas de mastite
Partindo do princípio de que um problema é um ponto fora da meta, temos a necessidade de monitorar os resultados através dos indicadores e, caso alguma medida fique fora da meta, devemos considerá-la um problema que deve ser gerenciado. O indicador é a ferramenta que transformará a percepção do problema em fato. O indicador transformará a frase “eu acho que tenho muitos casos de mastite, portanto tenho um problema” para “a prevalência de mastite está dois pontos acima do planejado, portanto tenho um problema”. Essa é a diferença fundamental entre fazendas sem gestão por resultados e com gestão por resultados.
Para entender melhor esse conceito, vamos analisar as imagens abaixo:
Figura 2 - Fazenda sem gestão por resultados
Esse indicador, parte do Gerencial Zootécnico da Clínica do Leite, mostra prevalência de mastite no rebanho, ou seja, a porcentagem de vacas em cada mês que estão com CCS acima de 200.000 céls/mL. Se você tivesse que avaliar se essa fazenda tem problemas de mastite ou não, como faria? Olhando os números em si, é provável que você afirme que durante os últimos doze meses essa fazenda teve problemas de mastite, já que a prevalência de vacas infectadas esteve sempre muito acima do recomendado, que é até 15%.
Vamos analisar agora o mesmo indicador com outra perspectiva:
Figura 3 - Fazenda com gestão por resultados
Essa fazenda estava focada em atuar em outras áreas e só iniciou um Plano de Ação para melhorar a taxa de prevalência de mastite em maio. Junto ao plano de ação houve também um ajuste nas metas: foi previsto que a prevalência iria cair gradualmente nos meses seguintes de 33% para 25%, sendo o limite superior e inferior final 27% e 20%, respectivamente.
Ao analisarmos o gráfico podemos observar que o plano de ação funcionou bem em junho e julho, e os resultados desses meses foram dentro do planejado. Isso significa que durante esses meses a fazenda não teve problemas de mastite, pois apesar da prevalência estar acima do recomendado ela estava dentro do previsto. Já no mês de agosto a taxa ficou acima do esperado, o que mostra que nesse mês a fazenda teve um problema com a mastite. Como a taxa de agosto ficou apenas um pouco acima do limite superior da meta, a fazenda optou por apenas continuar as ações previstas no plano de ação elaborado em maio com esperança de que o resultado de setembro estivesse dentro do previsto.
Infelizmente, como podemos notar, em setembro o resultado não só ficou fora do esperado como foi o pior dos últimos doze meses. O resultado fora da meta não deixa dúvidas: o fato é que a taxa de prevalência de mastite está 13 pontos acima do limite superior da meta, portanto essa fazenda tem um problema de mastite.
Definiu o problema, e agora?
Agora que a fazenda já sabe que tem um problema devemos estudá-lo, enfrentá-lo e resolvê-lo de uma forma que ele não volte a acontecer. O método indicado para isso é o OPA - Olhe, Pense e Aja.
Figura 4 - Método OPA
Começando pelo “Olhe” temos que estudar bem o problema em questão com o objetivo de entender qual o seu tamanho e quais são suas principais causas. Para isso vamos utilizar os Relatórios Gerenciais Zootécnicos da Clínica do Leite, começando pelo R401:
Figura 5 - R401
O R401 mostra a média de CCS individual histórica do rebanho, além de outros indicadores chave, como a taxa de prevalência, novas infecções e cura dos animais. Para diminuir a prevalência devemos diminuir a taxa de novas infecções e aumentar a taxa de cura.
A fazenda analisada está com a taxa de novas infecções acima do indicado (17% em média, sendo recomendado até 10%), e também está com a taxa de cura abaixo do indicado (23% de média, sendo recomendado pelo menos 50%). Com isso já temos dois fatos: a taxa de novas infecções está 7 pontos acima do indicado e a taxa de cura está 27 pontos abaixo do indicado, o que nos mostra a dimensão do problema.
O passo seguinte é avaliar se a alta prevalência segue algum padrão. O relatório R402 nos permite analisar se as infecções são predominantes em algum determinado número ou estágio da lactação. Vamos analisá-lo:
Figura 6 - R402
No histograma podemos ver que existe um maior número de casos entre vacas de primeira lactação, mas como o número de primíparas também é maior (como podemos ver na tabela), essa informação não é muito relevante. Já na tabela podemos ver que com exceção das vacas de NL 3, a tendência é que os animais apresentem um escore linear de infecção (E.L.) maior no terço final da lactação, o que indica que a contaminação está ocorrendo ao longo da lactação dos animais e de maneira homogênea em todo o rebanho. Isso é uma pista de que o principal agente de contaminação é contagioso. Outra informação interessante é que a prevalência é maior entre vacas multíparas.
Vamos analisar agora como está sendo a infecção durante a secagem e durante a lactação dos animais analisando o R405:
Figura 7 - R405
Na primeira tabela podemos analisar que a porcentagem de vacas que são secam sadias está 6 pontos abaixo do indicado, enquanto a porcentagem de vacas que são curadas durante a secagem está 3 pontos melhor do que o mínimo indicado. Podemos ainda notar que a porcentagem de vacas crônicas está 3 pontos abaixo do mínimo indicado e a porcentagem de novas infecções contraídas durante a secagem está 6 pontos acima do indicado. As conclusões são: as vacas não estão chegando ao fim da lactação tão sadias quanto esperado, estão se contaminando mais do que deveriam durante a secagem, porém o tratamento feito durante esse período está apresentando bons resultados, o que leva a um número baixo de vacas crônicas. De maneira geral, a secagem não está sendo uma causa muito relevante.
Na segunda tabela podemos analisar que a porcentagem de vacas sadias durante a lactação está 6 pontos abaixo do recomendado, enquanto a porcentagem de vacas que apresentam novas infecções durante a lactação está 6 pontos acima do indicado. Podemos analisar ainda que a porcentagem de vacas curadas está 28 pontos abaixo do indicado, enquanto a porcentagem de vacas crônicas está 28 pontos acima do indicado. As conclusões são que durante a lactação as vacas estão se contaminando mais do que o recomendado e não estão se curando. Isso mostra que o gargalo está justamente no controle da mastite entre as vacas em lactação.
Finalmente, vamos analisar o R406, onde podemos ver quanto cada vaca está contribuindo com a CCS do tanque:
Figura 8 - R406
O R406 usa os dados de produção e CCS de cada vaca para calcular quanto cada uma contribui com a CCS do tanque. Ele mostra ainda quanto ficaria a CCS do tanque caso o leite dos animais que mais contribuem fosse descartado. Como podemos observar, se o leite dos cinco animais que mais estão contribuindo fosse descartado, a CCS do tanque cairia para menos de 350 mil céls./mL.
Finalmente, com essas informações em mãos é necessário fazer a cultura dos animais infectados para descobrir qual o principal agente de contaminação do rebanho. No caso dessa fazenda, os principais agentes eram S. aureus e S. Agalactiae, confirmando a suspeita de que a contaminação era principalmente por agentes contagiosos.
Agora que temos todas as informações, precisamos “Pensar” sobre o que “Olhamos” e “Agir” sobre a causa raiz do problema. Uma das maneiras de organizar as informações é construir um Diagrama de Causa e Efeito com as principais causas do problema:
Figura 9 - Diagrama de Causa e Efeito
Com esse diagnóstico a fazenda pode discutir as questões técnicas e construir um Plano de Ação com as medidas mais adequadas para o seu caso. É importante que os resultados continuem sendo monitorados através dos indicadores para verificar se as ações estão fazendo efeito. Ao tratarmos os problemas dessa forma estamos profissionalizando a gestão da fazenda de uma forma simples e eficiente, e principalmente estaremos nos mantendo fiéis às metas estabelecidas, o que trará resultados satisfatórios para o negócio.