Assim como a temperatura, os preços ao produtor prometem cair novamente no mês de julho, uma situação atípica considerando a época de entressafra no Sudeste e Centro-Oeste. Segundo fontes da indústria, os consumidores não absorveram as altas de preços dos lácteos no varejo no início do ano - em especial do leite longa vida -, gerando queda nas vendas do produto, com consequente redução dos preços no atacado.
Outro motivo alegado pelas indústrias para redução dos preços foi o aumento da oferta. Segundo a Pesquisa Trimestral do Leite (IBGE), divulgada no final de junho, a captação formal no 1º trimestre/10 cresceu 5,71% em relação ao mesmo período de 2009, e 4,6% acima frente ao volume captado no 1º trimestre de 2008. Como pode ser visto no gráfico 1, o maior aumento se deu em março, último mês do trimestre, sugerindo que provavelmente os três meses seguintes tenham tido comportamento semelhante, notadamente em função do aumento dos preços ao produtor a partir de janeiro, aliado aos preços menores dos grãos (melhorando a relação de troca e favorecendo a alimentação do rebanho). Caso a produção tenha se mantido crescente nos 3 meses seguintes, é possível que o 1º semestre tenha fechado com um volume consideravelmente maior de leite internamente. Os dados de captação do Cepea, no entanto, apontam queda na oferta no segundo trimestre, de forma que não é possível ainda ter uma ideia clara do comportamento dessa variável no primeiro semestre.
Gráfico 1. Captação formal de leite no Brasil (em mil litros).
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Ao analisarmos o volume de leite disponível no mercado interno dividido pela população média do período, nota-se que houve um aumento na disponibilidade per capta no 1º trimestre de 2010 em relação a 2009. Nos primeiros 3 meses do ano, o consumo aparente de leite pelos brasileiros ficou em 27,07 kg/habitante, registrando uma disponibilidade 4,71% maior de leite por habitante. Esse valor - 4,7% - é superior ao crescimento médio do mercado em volume nos últimos 10 anos, que ficou ao redor de 3 a 3,1% ao ano.
Tabela 1. Disponibilidade per capta de leite no 1º trimestre de 2009 e 2010 (consumo aparente).
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Para o produtor, os últimos meses não foram ruins. Analisando os dados mensais desde o ano 2000, a Receita Menos Custo de Ração (considerando uma vaca com produção média de 20Kg de leite/dia) no mês de maio deste ano, corrigida para a inflação, só foi pior do que agosto a setembro de 2007 (gráfico 2), o que deve ter motivado o aumento da produção.
Gráfico 2. Receita menos custo de ração (R$/vaca/dia, corrigidos pelo efeito da inflação).
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O aumento da oferta, aliado à elevação de preços ao consumidor, resultou em diminuição das vendas e acúmulo de estoques em uma época pouco convencional. Em função disso, no atacado, as cotações do leite longa vida continuam em queda, com negócios entre R$ 1,30 a R$ 1,50/litro e, segundo agentes consultados pelo MilkPoint, muitas indústrias ainda estão com estoques consideráveis do produto (o que força os preços para baixo). O leite em pó também registra queda (cotado em média a R$ 6,80 - R$ 7,50/kg no atacado), e formação de estoques. No varejo, a queda do leite longa vida em junho foi mais evidente - em pesquisa realizada pelo MilkPoint na cidade de Piracicaba-SP, o leite UHT mostrou queda de 6,6% (- R$ 0,134/litro) no mês de junho em relação à média do mês de maio (em maio, a média ficou praticamente estável frente a abril). Em junho notou-se também um aumento na diferença entre o dia da pesquisa e a data de fabricação (tempo de prateleira) do produto.
Gráfico 3. Preços médios do leite UHT no varejo de Piracicaba-SP e dias de fabricação.
A queda nos preços do atacado reflete imediatamente no leite spot e, em um segundo momento, no preço ao produtor. O mercado spot (entre as indústrias) mostra-se bem desaquecido, com negócios na casa dos R$ 0,70/litro, R$ 0,20 a 0,30 centavos a menos do que os valores de pico.
As indústrias exportadoras não mostram-se animadas para fazer negócios no exterior. Os preços no mercado internacional estão instáveis, com tendência de queda, e com o câmbio atual, as indústrias alegam que não é possível viabilizar as exportações. Os preços do leite em pó integral estão em US$ 3.587/ton na Europa e US$ 3.500/ton na Oceania. No último leilão da Fonterra, realizado dia 06 de julho, o valor médio dos contratos para o leite em pó integral ficou em US$ 3.224/ton, mostrando queda significativa de 14,8% frente a junho.
A balança comercial de lácteos brasileira fechou o primeiro semestre de 2010 com déficit de US$ 70,5 milhões, com compras de 54,5 mil tonelada de lácteos, e apenas 28,4 mil toneladas exportadas.
Gráfico 4. Preços médios do leite em pó integral no Oeste da Europa, Oceania, e nos leilões da Fonterra.
Considerando a situação no mercado interno e a falta de estímulos vindos do exterior, o que se espera para os preços ao produtor, segundo a maioria dos agentes consultados, é de queda de até 8 centavos no pagamento de julho (leite de junho). Neste cenário, o ritmo da produção interna terá forte impacto na dinâmica das cotações: a queda de preços poderá desestimular a produção, gerando reajuste de preços para cima ainda no segundo semestre de 2010.